A banalização do estado de calamidade

  • 16/03/2022
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À luz do dia, o governo e o Congresso Nacional – leia-se os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco – tentam empurrar a decretação do estado de calamidade para baixo do tapete. Mas, na penumbra da noite, em conversas internas, o projeto ainda permanece como uma das soluções mais cogitadas pelas partes envolvidas para mitigar o estrago provocado pelo aumento dos preços dos combustíveis. A motivação para o decreto poderia vir do risco de crise na mobilidade interna. O custo dos combustíveis, além do impacto inflacionário direto e da fragmentação das cadeias de suprimento, poderia atingir o direito de ir e vir.

Ou seja: faltaria transporte para a população. Na verdade, a decretação do estado de calamidade teria como objetivo subliminar equacionar a questão da Lei da Responsabilidade Fiscal. As propostas para diluir o aumento do preço dos combustíveis que estão à mesa – redução do ICMS ou uso dos dividendos da Petrobras – ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), conforme disse o RR. O auxílio emergencial complementar, uma ideia da área política do governo, viria também para se contrapor ao inevitável aumento das passagens de ônibus. O problema de ordem impeditiva seria a dificuldade de encontrar fundos para compensação do gasto ou subsídio, conforme reza a LRF.

Paulo Guedes gosta da ideia do Decreto de Calamidade, e não está nem aí para a sua banalização – o expediente foi usado na pandemia e cogitado outras vezes. É a forma mais simples para não mexer na arquitetura fiscal. A medida teria também benefício eleitoral. A narrativa é que o decreto responde à preocupação com a mobilidade do povo, que precisa ir ao trabalho, aos hospitais e levar seus filhos na escola. E a guerra entre Rússia e Ucrânia pode levar a qualquer momento a um novo aumento de preços.

O discurso inteiro, na realidade, deixa atrás da cortina um fator sobrepujante: a LRF continua em vigor, e seu descumprimento pode levar as autoridades à cadeia. Paulo Guedes entende bem a dimensão do problema. Tanto que em outras vezes, em situação de dilema no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, disse com todas as letras que “não queria ser preso”. O Decreto de Calamidade resolve de pronto esse temor.

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