Ninguém enxerga que a indústria está morrendo?

  • 1/02/2021
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O RR apurou que a Secretaria do Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação do Ministério da Economia monitora, com preocupação, a situação da Audi no país. O receio é que a montadora alemã seja a próxima a encerrar sua produção no Brasil. Os movimentos recentes reforçam essa percepção. Em dezembro passado, a empresa suspendeu a fabricação do A3 Sedan, único modelo que era montado na unidade de São José dos Pinhais (PR). Ouvida pelo RR, a Audi foi diplomática. Afirmou que estuda um novo modelo para ser produzido no Brasil. Diz ainda que “boa parte dessa decisão passa pela definição do que irá ocorrer com os créditos de IPI acumulados durante os anos de Inovar Auto, que não foram integralmente devolvidos”.

O RR, contudo, reitera que a empresa estuda cair fora do país. Caso atravesse a porta de saída, a Audi se juntará a Ford, Ford Caminhões, Roche, Eli Lilly, Sony, Mercedes-Benz e Nikon, empresas que encerraram suas atividades industriais no Brasil desde o início do governo Bolsonaro. Diante do crescente êxodo de multinacionais, talvez tenha chegado a hora de rever o “super” Ministério da Economia. A “sub-pasta” da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação, colocada sob o guarda-chuva de Paulo Guedes tornou-se um apêndice menor e ineficaz, com graves reflexos para a economia, geração de empregos, retenção de talentos e mesmo estímulo à educação mais sofisticada no país. Com Guedes não vai haver policy para o segmento. O ministro despreza qualquer tipo de política industrial. Há uma bifurcação de motivos para esse “bye, bye, Brazil”.

De um lado, existe uma variável estrutural: o elevado Custo Brasil, uma questão que exige tempo para ser equacionada. Por outro, há um forte componente conjuntural. A gestão Bolsonaro não acena com PIB crescente, aumento de investimentos e muito menos incentivos – que não precisam, necessariamente, ser fiscais. O Chile, por exemplo, exige o compromisso de permanência de uma empresa por 10 anos para a concessão de benefícios. Por aqui, o governo Bolsonaro adota a política do “cada um por si”.

O BNDES hoje é tudo: estruturador de operações financeiras, adviser de privatizações, trem pagador do Tesouro, menos banco de fomento. Paulo Guedes diz que a indústria está crescendo. Como de hábito, ergue suas verdades sobre um terreno arenoso. Esse crescimento ao qual ele se refere se deve a três variáveis. Em primeiro lugar, a base de comparação usada – o mês imediatamente anterior – é baixa. Em novembro de 2020, a atividade industrial avançou 1,2% em relação a outubro. Por esse critério, foi a sétima alta consecutiva. No entanto, quando a comparação se dá com o mesmo período em 2019, foram 10 meses seguidos de baixa. Apenas em outubro e novembro de 2020 a indústria voltou a crescer frente aos mesmos meses no ano anterior.

Além disso, o auxílio emergencial e as políticas de cobertura de pagamento de salários dos trabalhadores durante a pandemia tiveram um impacto positivo circunstancial. Ressalte-se ainda o divórcio de boa parte dos brasileiros com as regras sanitárias: mais da metade da população determinou, com o apoio do presidente Bolsonaro, que o isolamento não precisava ser cumprido, o que antecipou a retomada da economia – ao custo de milhares de mortos a mais. Hoje, a indústria de transformação responde por 11% do PIB, o menor nível desde 1947. Há estimativa que chegue a 9% em 2024.

Segmentos vitais vão recuar ainda mais. A formação bruta de capital fixo deve cair 2,3% no quarto trimestre de 2020 em comparação com o terceiro, segundo projeção do Boletim Macro do Ibre-FGV. A construção civil, que tem peso no cálculo do PIB industrial, deu um piparote em dezembro, com a maior utilização de capacidade operacional desde 2014. Mas, a previsão da Câmara Brasileira da Indústria da Construção é de uma queda de 2,8% do PIB do setor em 2020. Esse cenário provoca efeitos colaterais que podem demorar anos para serem curados. Há uma crescente exportação de talentos no país, notadamente para países como Estados Unidos, Alemanha e Suécia. São profissionais de alta formação que potencialmente teriam de ser absorvidos pela indústria nacional. E daí.

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