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“Está faltando algo aí, meu sinhô”, cantaria Nelson Sargento, resumindo a política econômica na letra do samba. Apesar do ajuste fiscal progressivo – previsto para 20 anos – ter sido celebrado como um avanço, dadas às circunstâncias, a percepção de insolvência continua firme e forte. A contenção de despesas prevista na PEC 241 é condição necessária, mas insuficiente para a estabilização. Os ganhos com a reforma da Previdência e a esterilização de gastos com a PEC só se farão sentir no resultado primário seis a sete anos após sua aprovação. 2016 é um ano já falecido. Em 2017, a dívida bruta aumentará de 72,5% para 75,8% do PIB – alta de R$ 69 bilhões. Hoje a dívida bruta vale R$ 3,04 trilhões; em dezembro, vai a R$ 3,3 trilhões. Com o ajuste diferido no tempo, a relação dívida bruta/PIB cairá a passos de cágado – isso após escalar uma montanha. Com muita sorte descerá a 77%, segundo estimativas do Tesouro Nacional – pouco menos que os 75,8% projetados para 2018. Está faltando algo aí. Sim, está faltando a dívida bruta nesse samba. Digamos que Michel Temer seja o que fala e, destemido, decida cortar 18% (o número é aleatório) da dívida bruta em 2017. Sem contar com os efeitos favoráveis que virão de lambuja, como a queda do custo de carregamento da dívida com a redução dos juros, a relação dívida bruta/PIB desabaria. Para isso seriam necessários R$ 600 bilhões redondos. Os recursos poderiam ser amealhados por uma nova rodada de repatriação, securitização da dívida ativa, redução expressiva das desonerações e subsídios, novos tributos (Cide, bebidas, fumo, fortunas) ou mesmo empréstimo compulsório, para tirar o estigma do imposto (impressão de caráter permanente), concessões, PPPs, dividendos das estatais, alienação de parte da carteira da BNDESPar, uma venda modesta entre US$ 30 bilhões e US$ 50 bilhões de reservas cambiais etc. A queda da dívida bruta daria um tiro de morte na percepção de insolvência, melhoraria a nota do Brasil dada pelas agências, reduziria o custo de captação no exterior e tornaria irrefutável a compreensão de que o país atacou a raiz da sua doença. 2017 seria ano do choque de expectativas, da virada da economia. Por ora, as previsões dos organismos multilaterais e instituições financeiras internacionais, além das agências de rating, refletem a mesma sensação de fastio do empresariado. Imagine um setor privado, cuja indústria automobilística se afoga em capacidade ociosa, a indústria de bens de capital não consegue receber o devido e não tem perspectivas de novas obras, a indústria de construção pesada derreteu, a indústria de bens de consumo não duráveis é atingida pela queda da absorção doméstica, a indústria de produtos intermediários não vê obra no horizonte, o comércio exterior dá saltos de 20 centímetros etc. E a contribuição do Estado é pífia. O desemprego de 11%, a inadimplência recorde das famílias e o maior número de recuperações judiciais demonstram que a conta da retomada tem algarismos de menos. Henrique Meirelles parece ter esquecido que o único indicador macroeconômico compreendido como um sinal de juízo na política econômica é o déficit nominal, irmão xifópago da relação dívida publica bruta/PIB. O déficit nominal, que anda na casa de 9,4% do PIB, será de R$ 340 bilhões em 2016 – o primário, um pouco acima de R$ 150 bilhões. Daí para frente, o primário começa a cair e o nominal segue subindo. Está faltando algo aí, mô irmão.
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