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O incomum desconvite aos chefes de estado e de governo de Cuba e da Venezuela para a posse de Jair Bolsonaro foi uma decisão de fora para dentro do Itamaraty. Não houve qualquer tipo de recomendação do ministério das Relações Exteriores nessa direção; nem agora, nem em nenhum momento anterior. A medida partiu do próprio núcleo duro de Bolsonaro e, mais do que qualquer outro significado no âmbito internacional, teve como objetivo principal atender as bases eleitorais domésticas. Com a decisão, o presidente eleito corrobora o discurso de campanha e avança no processo de “vilanização” dos governos socialistas dos dois países. Trata-se de um gesto que pode ser interpretado, desde já, como uma avant première da condução da área de Relações Exteriores no governo Bolsonaro.
Mesmo antes de Ernesto Araújo assumir o Ministério, a linha já está sendo ditada e imposta ao Itamaraty: tudo leva a crer que a política externa brasileira será, em grande parte, indexada e condicionada à política interna. A partir deste entendimento de que as relações internacionais do Brasil serão guiadas com um olho na opinião pública, já existem preocupações no corpo diplomático do Itamaraty quanto aos possíveis desdobramentos desse primeiro movimento de agravo a Cuba e Venezuela. Não são pequenas as chances de que a medida descambe para atos ainda mais contundentes como a retirada do embaixador brasileiro de Havana e Caracas ou, em um caso mais extremo, no rompimento das relações diplomáticas com os dois países.
Ressalte-se que a eventual ruptura diplomática não precisaria ser automaticamente acompanhada de um rompimento das relações comerciais, não obstante os dois países terem participação pouco relevante na balança brasileira. Há antecedentes nesta direção na própria história brasileira. Durante o governo de Juscelino Kubitschek, mais precisamente em 1958, o Brasil retomou os negócios com a União Soviética embora o Senado tenha vetado o reatamento das relações diplomáticas com o país, suspensas em 1947 pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra. Em um primeiro momento, o atípico movimento em relação a Venezuela e Cuba poderia soar como uma espécie de oferenda ao governo Trump, um ponto de alinhamento extremo à política diplomática norte-americana.
Não que inexistam sinais nesta direção. Muito pelo contrário. Mas, segundo informações auscultadas do próprio Itamaraty, eles não passam pelos dois países latino americanos. Basta lembrar que representações diplomáticas de ambas as nações socialistas estiveram presentes à própria posse de Trump, em janeiro de 2017. O governo de Donald Trump certamente veria com bons olhos sinais de distanciamento do Brasil em relação ao Irã, que tem sido alvo de seguidas e pesadas sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos.
Do ponto de vista pragmático, no entanto, trata-se de um afago mais custoso de ser feito pela gestão Bolsonaro. O Brasil tem um superávit comercial alto com os iranianos. Entre janeiro e setembro deste ano, por exemplo o saldo foi de aproximadamente US$ 4,5 bilhões, impulsionado, sobretudo, pelo aumento de mais de 520% nas exportações de milho. No mesmo período, este número só foi superado pelo superávit com a China (US$ 20 bilhões). Em outro front, existe a já notória questão de Israel. Tudo indica que Jair Bolsonaro cumprirá a promessa de transferir a Embaixada brasileira de Tel-Aviv para Jerusalém, seguindo os passos do governo Trump. Um gesto ainda mais bem-visto pelos Estados Unidos seria o reconhecimento pelo Brasil da cidade santa como a capital de Israel, algo que dependeria de um ato executivo da Presidência da República.
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