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O que precisa ser dito
Embora aguardada desde o encontro entre Lula e Trump na Assembleia Geral das Nações Unidas, foi auspiciosa a videoconferência desta manhã devido ao clima positivo e amistoso que ambas as partes confirmaram independentemente. Para um profissional que chama o Itamaraty de “minha Casa”, o mais importante foi o fato de que a notícia da reunião virtual pegou todo mundo de surpresa, não havendo ao que se saiba nenhum vazamento em Brasília ou Washington, embora certamente ela tivesse sido cercada de todo o ritual que envolve os diálogos entre chefes de Estado pois, de outra forma, nosso presidente não estaria acompanhado de seus principais auxiliares nos contatos com os Estados Unidos. Isso significa que a questão já se encontra na mão dos profissionais, quando são bem menores os riscos de acidentes de percurso.
Abre-se assim o espaço esperado para uma discussão de temas econômicos, ficando na lixeira da História a tentativa mal-sucedida de Trump de utilizar o julgamento de Jair Bolsonaro como um pretexto para atacar a soberania brasileira. Essa estratégia, sem dúvida preconizada por figuras malignas como Steve Bannon, atraiu Eduardo Bolsonaro para uma aventura suicida em que ele se julgou, junto a Paulo Figueiredo, capaz de ditar a política da Casa Branca com relação ao Brasil. Como recordação desse desvario, ficarão para sempre as imagens inesquecíveis da imensa bandeira norte-americana na Avenida Paulista e o boné MAGA usado por um Tarcisio sorridente.
Obviamente, Trump – que nada tem de louco pois é um frio negociador sempre disposto a voltar atrás quando as circunstâncias exigem – foi informado de que se transformara no melhor cabo eleitoral de Lula, vivendo meses atrás seu pior momento na política. Mais ainda, entregara de bandeja às forças da esquerda os símbolos nacionais verdes e amarelos que a direita vinha utilizando para caracterizar seu amor à Pátria e à família. Diante do comportamento impávido do Supremo Tribunal Federal, de importantes segmentos do próprio Congresso e sobretudo das ruas, as ameaças ruíram. Nada mais significativo disso do que a circunstância de Trump, em seu discurso na ONU, não haver nem mesmo mencionado o nome de Jair Bolsonaro ou sua condenação a vinte e sete anos de prisão. Para bons entendedores, página virada.
Há quem, ainda hoje, tenha ficado preocupado com a designação de Marco Rubio como principal responsável pelas futuras tratativas com a trinca Alckmin, Haddad e Vieira. Sem dúvida, o Secretário de Estado norte-americano, como muitos descendentes de famílias que tiveram de abandonar Cuba durante o regime de Castro, é uma figura que defende o alinhamento automático dos países da América Latina às diretrizes emanadas de Washington, que gostaria de ver o Brasil se afastar do BRICS, que prefere lidar com um Milei do que com Lula. Mas, a rigor, esses desejos sempre estiveram mais ou menos presentes em nosso relacionamento com os Estados Unidos e o que se vê ultimamente é um domínio absoluto de Trump sobre seus áulicos. Rubio fará o que seu mestre mandar.
Finalmente, conheceremos em breve, como era bem sabido, os reais interesses norte-americanos no tocante às Big Techs e seus data centers, bem como com aos minerais estratégicos e à maior presença do etanol no mercado brasileiro. No outro prato da balança estarão nossos interesses em eliminar os 40% de tarifas punitivas, já aplicada a uma gama bem menor de produtos do que se temia no primeiro momento, contando, nesse caso, com o trabalho dos empresários prejudicados nos dois países.
O que se recomenda agora é grande sobriedade da parte do Palácio do Planalto – aliás já visível desde que Lula se aprestava a ir a Nova York –, a necessária tranquilidade para que os profissionais possam trabalhar longe das luzes da ribalta. Repor um comboio de trens nos trilhos é tarefa de engenheiros especializados.
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