Eduardo Paes inventou uma caixa-preta para esconder-se de si próprio - Relatório Reservado

Política

Eduardo Paes inventou uma caixa-preta para esconder-se de si próprio

  • 15/07/2020
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O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, precisa encontrar um outro slogan além da caixa-preta para justificar a lambança na operação de bilhetagem do Rio, com a criação do Jaé. A caixa-preta, seja lá o que contenha, refere-se ao motivo intrincado pelo qual dedicou sua gestão ao cassar o direito da Riocard  – empresa pertencente à holding Riopar, que tem como acionistas sindicatos de ônibus. Sempre foi assim. Até porque a Riocard é uma das poucas prestações na área dos serviços públicos que atende bem ao cidadão carioca. Até a atual gestão, Paes não tinha identificado o “anátema” da Riocard. Não que o alcaide não fizesse críticas operacionais ao sistema. Mas em meados de 2023, surge a demoníaca caixa-preta. A partir daí, a expressão é a bête noire do prefeito, repetida ad nauseam, como se não houvesse outro assunto relevante em sua gestão. Paes pode até estar sofrendo de um transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) com a enigmática caixa-preta. Ou mesmo de ecolalia ou palilalia – distúrbio de repetição de palavras. A caixa-preta esconderia cobras e lagartos, e sobre esses bichos haveria um manto granítico encobrindo sua transparência. E mais não se revela. Ora, se for um problema de ordem psicológica, ou algum tipo de paranoia, Paes precisa urgentemente se tratar. Sua fixação pelo termo, que significa mais um conceito do que dados objetivos, está transtornando o transporte urbano da cidade. Ao mesmo tempo, o prefeito parece querer quebrar as empresas de ônibus do município.

Mas vamos aos fatos. O RR consultou 80 veículos de comunicação impressos e online do Rio de Janeiro, entre julho de 2023, aurora do Jaé, e maio de 2025, com a nova operação de bilhetagem já entrando em “pleno” funcionamento. Nesse intervalo, Paes fez 1.237 menções críticas a caixa-preta (65%) e 665 (35%) críticas operacionais ao funcionamento do sistema – aspectos variados do mal serviço da mobilidade no Rio. O total é de 1.902 críticas, sendo que, com relação aos aspectos diversos, o prefeito também inclui, indiretamente, a famigerada caixa-preta. Com relação às menções críticas ao Jaé, o prefeito, o criador, não condena a sua própria criação, que parece ser um sistema perfeito. Não é o que pensam os usuários do Jaé. Em idêntico levantamento, foram relacionadas as menções críticas de usuários, nas mesmas mídias e mesmo intervalo de tempo. A diferença é abissal: são 21 menções diretas ao termo caixa-preta, somadas as críticas à falta de transparência e ao acesso aos dados (8%) e 2.244 citações ao Jaé (92%), todas com queixas ao funcionamento da nova bilhetagem. Paes não aceita reclamações sobre o Jaé, e interpela a própria imprensa quando ela tenta fazer seus questionamentos. Na entrevista coletiva, no dia 8 de janeiro, durante o anúncio de mais um adiamento da bilhetagem exclusiva do Jaé, o prefeito chamou os empresários de ônibus de “mafiosos” da cidade; disse que bilhões estão em jogo; e mais uma vez afirmou que vai abrir a caixa-preta. Na ocasião, Eduardo Paes usou a expressão máfia ou mafiosos oito vezes para se referir à Semove, entidade representativa dos ônibus do Rio de Janeiro. Paes submeteu ao constrangimento até os jornalistas presentes, que ele identificou como “jornalistas que defendem o Riocard”. Apontando para eles, que estavam em um canto da sala, o prefeito disse que os profissionais da imprensa não deveriam ficar do lado dos empresários de ônibus. A sanha do alcaide o levou a perder a lisura quando postou vídeos atacando a concorrência do Jaé da forma mais rancorosa, se mostrando de corpo inteiro nas redes sociais.

Não faltam vitupérios lançados contra a caixa-preta. Paes usa a palavra “delinquente” para se referir aos empresários de ônibus, que seriam os usufruidores da “mamata”. Em recente editorial, O Globo comenta a irracionalidade na operação do Jaé, afirmando que “é patética a confusão em torno do lançamento do cartão Jaé, exigido desde o último fim de semana para usuários com direito a gratuidade nos transportes municipais do Rio de Janeiro – ônibus, BRT, VLT e vans. A obrigatoriedade será estendida a todos os passageiros a partir de 2 de agosto. Quem usa trens, metrô, barcas e ônibus intermunicipais, sob controle do estado, precisará ter outro cartão. Trata-se de uma irracionalidade. A exigência de dois cartões e incompatível com as boas práticas de qualquer metrópole”.

Observando por qualquer ângulo, é difícil encontrar motivos para tamanha indisposição do prefeito em negociar uma solução pacífica para resolução dos problemas que porventura existam na bilhetagem. Consta que o alcaide sequer aceita receber os donos da Riocard. É ruim, porque qualquer tipo de autoritarismo envolvendo a coisa pública, tal como proibir que o atual operador participasse do leilão da bilhetagem, induz à fantasia de alguma circunstância inconfessável. Ressalte-se que em nenhum momento pretende-se criminalizar o prefeito. Até prova em contrário, ele é ilibado e não há caixa-preta nenhuma que leve a se pensar de outra forma. Acusar o prefeito, jamais. É mais fácil Paes estar dormindo com um paralelepípedo sobre a cabeça, tamanha sua obsessão.

#Eduardo Paes #Jaé #Rio de Janeiro

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