Telebras passa por processo de engorda para gerar sua própria receita - Relatório Reservado

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Telebras passa por processo de engorda para gerar sua própria receita

  • 21/10/2024
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O governo tem planos de transformar a Telebras em uma empresa integrada de telecomunicações, conectividade e segurança cibernética, com uma atuação transversal a toda a gestão federal. Os estudos feitos no Ministério das Comunicações avançam nas mais diversas direções. A atuação da estatal iria de banda larga por satélite a gestão e proteção da base de dados de órgãos federais, passando pela operacionalização de um novo sistema de comunicação e troca de mensagens entre membros da alta cúpula do governo.

Segundo o RR apurou, até mesmo a possibilidade de desenvolvimento de softwares de inteligência artificial está em pauta. O upgrade da Telebras conversa com a proposta da equipe econômica de criar novas regras no orçamento para que estatais dependentes do Tesouro venham a gerar receita própria. Há 17 empresas públicas que somente sobrevivem graças a repasses da União. É o caso da Telebras – o orçamento federal deste ano prevê a transferência de R$ 800 milhões à estatal.

Há, inclusive, um burburinho em Brasília que o Palácio do Planalto avalia um novo aumento de capital na empresa. O aporte seria superior aos R$ 400 milhões injetados na companhia em junho deste ano. Pode até parecer um paradoxo no momento que Fernando Haddad e Simone Tebet fazem contorcionismos para cortar gastos públicos. No entanto, como esperar que uma estatal com notórias limitações financeiras como a Telebras amplie seu raio de ação e seja minimamente autossustentável sem um empurrãozinho inicial?

Na prática, o governo está jogando para dentro da Telebras uma série de projetos hoje dispersos em diferentes áreas da gestão federal. Nesse balaio, é preciso separar o joio do trigo. Algumas iniciativas soam mais factíveis do que outras. É o caso da criação de uma plataforma para concentrar a comunicação e a circulação de dados entre autoridades. Hoje esse fluxo é feito por aplicativos distintos, notadamente o WhatsApp, o que gera incômodo entre instâncias mais sensíveis de Poder. Há cerca de dois meses, não custa lembrar, Ricardo Capelli, ex-secretário executivo do Ministério da Justiça e hoje na presidência da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), anunciou a intenção de contratar uma empresa nacional para prover a comunicação interna na entidade, hoje feita por meio do WhatsApp.

A integração na Telebras da gestão e proteção de dados de ministérios e órgãos federais também é uma proposta exequível. De certa forma, esse processo já teve seu pontapé inicial. Em agosto, a Telebras firmou contrato com o Ministério do Trabalho para prestar serviços de conectividade e monitoramento de ataques cibernéticos a 409 agências da Pasta. Em Brasília, há informações de tratativas também com o Ministério da Previdência para a proteção de dados do INSS.

Essa é uma notória fragilidade do Estado brasileiro. O sistema de defesa cibernética do país é um queijo suíço, vide os seguidos episódios de invasões e vazamento de dados. Segundo o Centro de Prevenção, Tratamento e Resposta a Incidentes Cibernéticos do Governo (CTIR-Gov), no primeiro semestre deste ano houve 4,7 mil “incidentes cibernéticos” em sistemas do governo federal, quase o dobro do número de registros em igual período em 2023. 

Por outro lado, alguns dos planos discutidos no Ministério das Comunicações para o upgrade da Telebras são de difícil execução, por uma combinação de limitações de ordem tecnológica e financeira. É o caso da proposta de fazer da estatal uma grande operadora de banda larga por satélite, com capacidade de atender demandas públicas e privadas. A própria gênese da ideia já remete a uma certa dose de megalomania. Ou de bravata.

Ela nasceu do pretensioso desejo do governo Lula de ter uma empresa capaz de concorrer com a gigante Starlink, de Elon Musk. De forma direta ou indireta, a companhia de Musk presta serviços a uma série de estatais e órgãos públicos, além das Forças Armadas brasileiras.

Em agosto, a Anatel autorizou a contratação direta da Telebras nas fases 2 e 3 do Aprender Conectado, programa de integração digital entre as escolas públicas do país – as duas etapas contemplam cerca de cinco mil estabelecimentos de ensino. Ainda assim, a entrada da estatal no negócio é cercada de questionamentos, a começar pelo custo para os próprios cofres públicos.

A Telebras está cobrando R$ 558 milhões para conectar 3.200 escolas, o que dá um custo médio de R$ 174,3 mil por colégio, conforme informação do portal Capital Digital. No ano passado, a Starlink apresentou uma proposta de R$ 631 milhões que cobria 5.432 escolas públicas, ou seja, uma média de R$ 116,1 mil por unidade. É um paradoxo que a contratação de uma controlada, caso da Telebras, custe mais aos cofres da União do que um acordo com a empresa do “inimigo” Elon Musk.  Some-se a isso o fato de que a Telebras está engatinhando nesse tipo de serviço.

Por meio do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas, a estatal soma pouco mais de 20 mil usuários de banda larga satelital. A própria Starlink, primeira do ranking, é dez vezes maior, com mais de 215 mil clientes no Brasil. A segunda maior desse segmento, a Hughesnet, tem aproximadamente 180 mil usuários. A estatal brasileira oferece internet por satélite com uma velocidade máxima de 60 MB por segundo; a Starlink, com seus mais de 6,3 mil equipamentos de baixa altitude orbitando ao redor da Terra, opera com 200 MB.

Há muito tempo a Telebras não sabe o que é lucro. Entre 2020 e 2023, acumulou um prejuízo de R$ 527 milhões. Ainda assim, o governo considera que a sua metamorfose, de uma estatal que cheira a passado para uma empresa de telecomunicações, proteção de dados e segurança cibernética, é possível. Talvez seja. A questão é exatamente decantar os projetos viáveis dos devaneios.

Lula, por exemplo, já disse publicamente que a Telebras pode ser a grande desenvolvedora de Inteligência Artificial no Brasil. Esses rompantes ufanistas costumam ser território fértil para extravagâncias, vide a Ceitec, a “semi” fabricante de “semicondutores” criada em 2008, no segundo mandato de Lula, que pouco ou nada produziu.

 

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