O quid pro quo dos militares no governo Bolsonaro

  • 29/07/2020
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Yang: Desde os primórdios do período eleitoral todos sabiam que o capitão não tinha quadros técnicos nem conhecimento da burocracia de Estado e iria povoar a máquina pública com o único contingente de que dispunha, os militares. Por sua vez é óbvio que um grande número de oficiais acaba indexando as Forças Armadas ao governo. O que é negativo, mas, na atual circunstância, necessário.

Yin: Mas tem a possibilidade de golpe.

Yang: Que golpe?

Yin: Trump tem quatro generais em postos chave e povoou com a garotada de West Point vários cargos do governo. De toda forma, longe dos milhares de militares do governo brasileiro. Além do mais, não faz sentido comparar a democracia pétrea norte-americana com a nossa tradição de intervenções militares. O pessoal de verde-oliva é bom quando guardado dentro dos quartéis.

Yang: Mas oficiais bem treinados e pensantes não podem prosseguir prestando serviço ao país? Eles têm que obrigatoriamente vestir o pijama e jogar peteca na praia?

Yin: Por trás desse incômodo com os militares há o fantasma de 1964, que traduz em golpe qualquer presença de militares fora dos quartéis.

Yang: Mas não vai ter golpe.

Yin: Mas digamos que tenha um golpe, lá estará um batalhão entrincheirado no governo.

Yang: E o que se faz então? Cria-se uma dosimetria para a participação dos militares no governo?

Yin: A presença de um número tão grande de militares – cerca de 6.000 – desprofissionaliza a burocracia do governo, que, por sua vez, é capturado por um estamento. Melhor fazer como Paulo Guedes que ocupou sua Pasta com quadros técnicos. Fez igual ao Delfim. Só que com os ex-ministros estavam os Delfim ´s boys e com Guedes, os Chicago Oldies.

Yang: Essa democracia que trata os militares como morféticos não nos serve.

Yin: A birra com os militares da reserva do governo – os da ativa concordamos que estão fora do seu lugar – provém de algumas manifestações de generais do Planalto acima do tom, que são associadas aos quarteis. Estes oficiais da reserva deveriam ser mais discretos.

Yang: Os militares são alguns dos melhores quadros administrativos do país. Estranha-se que justamente na pandemia, quando o recrutamento dos oficiais da reserva deveria ser obrigatório, haja toda essa revolta com os militares no governo.

Yin: Contudo, logo após a posse, a popularidade dos milicos era bem maior – 62% dos brasileiros torciam pelas Forças Armadas no poder. Em abril, já na pandemia, esse percentual tinha caído para 49% (dados Ibope). Essa queda não seria razão também do excesso de militares em serviço no governo terem associado a imagem das Forças Armadas a Bolsonaro?

Yang: Há manipulação política nessa história toda. As Forças Armadas só cederam 13% de oficiais da ativa ao governo comparados aos oficiais da reserva lotados em cargos públicos, mais da metade já ocupando funções antes da eleição de Bolsonaro.

Yin: Entretanto, o Instituto Datafolha, agora mesmo em maio, identificou que 52% da população eram contrários aos militares no governo.

Yang: A pesquisa do Latinobarómetro, em sua última rodada, diz que acima das Forças Armadas em termos de credibilidade só a Igreja. Os militares, portanto, estariam muito bem, pois acima da Igreja só existe Deus.

Yin: Mas os números absolutos dos militares do governo são enormes e ameaçam a democracia.

Yang: Melhor seria que eles tivessem aparelhado o governo Lula ao invés dos sindicalistas: não teria roubalheira nem impeachment.

Yin: Defendo que nenhuma corporação capture o Estado.

Yang: Os militares são diferentes: têm uma tradição de sentimento pátrio.

Yin: Mas, nunca se esqueça: tem o risco de golpe.

Yang: Pura obsessão negativa com os nossos soldados.

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