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Haddad já enxerga dois futuros: um bem próximo e o outro mais distante

  • 25/02/2025
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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem conversado com Claudio Haddad, segundo apurou o RR. O fundador do Insper é um interlocutor discretíssimo, passa ao largo da mídia e dos eventos realizados por instituições financeiras. Apesar do sobrenome homônimo, não há qualquer parentesco entre ambos.

Mas a relação entre os dois Haddad vai além do vínculo pretérito entre contratante e contratado – antes de ocupar o cargo, o ministro da Fazenda deu aula no Insper. Digamos que o convívio esteja mais para consultante e consultor. Antes de mais nada, o caráter e a integridade de Fernando Haddad não sinalizam que ele vá deixar o posto.

Lula também não o deixaria fazer isso – pelo menos na primeira hora – porque sabe que o abandono de Haddad levaria a uma crise de proporções inusitadas no mercado, além de ser um bombom para a oposição. Mas paciência e estado de humor têm limites. É sabido que o ministro, mesmo dotado de uma têmpera de aço, tem sido suscetível a crises de depressão.

Uma das demonstrações de que o velho e bom Fernando Haddad, um mestre em conduzir situações de crise política relacionadas à área econômica do governo, cedeu a um novo Haddad, menos arguto, ou talvez mais cansado, foi o atraso na liberação de recursos do Plano Safra. O ministro deu carne temperada à ala radical do PT, que nunca aceitou a sua política mezzo ortodoxa, e às harpias do Palácios do Planalto.

O governo já está cansado de saber que com ruralistas não se brinca. A bancada mais rica do Congresso bateu nas portas do Palácio cobrando o dinheiro prometido. A suspensão dos pagamentos do Plano Safra, em meio a um discurso do governo de que os preços elevados dos alimentos cairão com início da hiperbólica safra esperada, funcionou como proteína para os sequiosos em fritar o ministro da Fazenda.

Aliás, o atraso na liberação das verbas foi uma vacilada tripla. A responsabilidade pelo episódio deve ser dividida entre o Congresso Nacional, que tem usado o atraso na aprovação do Orçamento Federal como moeda de troca em suas barganhas, o enfraquecimento político de Lula e a própria ingenuidade de Haddad, que já poderia ter editado uma Medida Provisória liberando os recursos.

A MP acabou saindo, mas por iniciativa direta do próprio Palácio do Planalto. Haddad parece ter esperado a crise para que Rui Costa e coadjuvantes de primeira grandeza no Palácio se antecipassem ao ministro e ganhassem o crédito pela MP da liberação dos recursos.

Não bastasse o erro de cálculo político, o ministro pode estar sendo empurrado para uma armadilha nos próximos dias: um encontro de Lula com os atacadistas, com o objetivo de baixar os preços dos alimentos da cesta básica. Haddad já manifestou ao presidente que esse apelo não funciona.

Se, por acaso, essa difícil cooperação se desse no curto prazo, mais à frente – e ninguém sabe quão a frente – os atacadistas recuperariam a redução das suas margens repondo os preços e devolvendo a inflação. Há ainda um fator que foge ao cálculo político dos estrategistas do Palácio, e Haddad não tem nada a ver com isso.

O ex-presidente Jair Bolsonaro caiu na mesma esparrela e foi acompanhado do seu superministro pedir a colaboração dos supermercadistas para contenção dos preços. Não deu em nada. Atacadistas e supermercadistas são a mesma farinha em sacos diferentes. Se Haddad acompanhar Lula, comparecendo à pantomima, repete a comédia de Bolsonaro e Guedes.

Além de tantas rasteiras, o governo pode ser obrigado a praticar uma fração do shutdown (suspensão de pagamentos públicos), caso o Congresso irresponsavelmente atrase para depois de março a aprovação do Orçamento. Provavelmente a culpa será jogada nas costas de Haddad. Entre os tantos apitos que o ministro tem de tocar simultaneamente está o das negociações com os políticos para aprovação de medidas.

Haddad joga esse jogo sozinho porque não tem o apoio dos ministros que deveriam tourear a área parlamentar. Por ora, não se sabe muito bem o que fazem no governo. Com todas as ressalvas, Haddad é quem mais se aproxima, de um estadista entre os come-dorme e os conspiradores do Palácio.

Poderia ser chamado de “estadista saci” por não contar com a principal perna: o apoio inconteste de Lula.  Pelo contrário. Hoje é obrigado a conviver com o descontrole do presidente, que ruge publicamente bravatas contra as medidas econômicas do seu ministro. Mas Haddad segue em frente, entrando e saindo do caldeirão fervente.

E, afinal, o que as conversas ao pé de ouvido com Claudio Haddad têm a ver com isso tudo? Fernando Haddad corre na esteira sabendo que há uma cenoura a lhe esperar em 2026: sua eventual candidatura à Presidência. Se conseguir chegar lá. Mas o futuro está ali na esquina, e o ministro tem de pensar nas suas alternativas caso o “Plano A” faça água. Hoje não é o mais provável.

Apesar da disposição de Lula em disputar um quarto mandato, Haddad continua sendo o regra três com maior possibilidade de substituir uma mudança na virtual candidatura do presidente.

Falta muito tempo ainda para definições. Mas Haddad (Claudio) admira e mantém ótimas relações com Haddad (Fernando), que, por sua vez, se sente em casa na academia. No passado, o Insper foi o ponto de transição no hiato do ministro em sua vida política. Quem sabe ele não volte a São Paulo, no papel de educador, aguardando que o cavalo encilhado passe novamente a sua frente, dessa vez em 2030.

#Fernando Haddad #Lula

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