Até onde o BC está disposto a ir com o PIX?

  • 14/07/2021
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Qual é o ótimo de Pareto do PIX? O sistema criado pelo Banco Central veio para ficar, com seus inegáveis benefícios: agilidade na transferência de recursos, redução de custos tarifários e maior inclusão financeira. No entanto, a nova ferramenta tem pontos cegos, notadamente de natureza regulatória e quanto aos aspectos redistributivos entre os atores do mercado. Há um receio de que, no futuro, o PIX se transforme em um agente monopolista do setor financeiro.

Além dos pagamentos instantâneos, que outros serviços virão? O PIX pode vir a ser uma plataforma de oferta de crédito, um balcão de venda de seguros ou mesmo uma corretora de valores, entre outros. Ou seja: um “quase banco” gerado no ventre do BC. Os avanços proporcionados pelo PIX são indiscutíveis. Trata-se de uma inovação com função social e já incorporada por boa parte da população. A discussão principal, no entanto, diz respeito aos limites do sistema. Até que ponto, por exemplo, um órgão regulador pode seguir intermediando serviços e concorrendo diretamente com as instituições que ele próprio regula.

Guardadas as devidas proporções, é como se a CVM criasse uma bolsa de valores sem emolumentos. Ressalte-se que o raio de ação do sistema não ficará restrito a serviços no âmbito doméstico. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, já anunciou conversações com autoridades italianas para criar uma espécie de “PIX Internacional”. Segundo o RR apurou, além da Itália, haveria tratativas nesta direção com Espanha e Portugal. A julgar pelas origens do grande influenciador do pensamento liberal de Paulo Guedes, o ex-ministro Roberto Campos – avô de Campos Neto -, o Banco Central poderia ser até privatizado sem qualquer problema.

São palavras textuais de Campos quando era senador. No futuro, hipoteticamente, o BC poderia abrir o capital da plataforma, transformando-a em uma public company, por exemplo. Olhando-se para a essência do negócio, não é algo simples. O PIX ficaria sem o pilar que sustenta a isenção de tarifas, ou seja, o custeio da operação pela autoridade monetária. Mesmo em um modelo de privatização por dentro do sistema financeiro, em que os bancos eventualmente se tornassem sócios da operação, dificilmente isso se daria sem qualquer ônus para os usuários.

Ou seja: o PIX perderia uma de suas razões de existir. O RR conversou com o Banco Central sobre o assunto, a partir de uma troca de e-mails. Neste momento, o BC parece mais à vontade em falar do presente do que do futuro do PIX. Quando consultada sobre a possibilidade de o sistema contemplar produtos financeiros, como venda de seguros ou concessão de crédito, a autoridade monetária não quis estabelecer uma linha de corte para a atuação do PIX. O BC limitou-se a tratar de medidas já contempladas na chamada “agenda evolutiva”, cronograma fixado até o segundo trimestre de 2022, que prevê a implantação de serviços como conta salário, saque e débito automático.

Enfim, outras operações de pagamento, ou seja, mais do mesmo. O RR também perguntou ao BC se não há uma contradição no fato de um agente regulador ser também intermediário de transações financeiras. Ao responder à newsletter, o banco deixou a sensação de que menospreza essa questão: “O BC é responsável pela regulação e pela supervisão do sistema financeiro de pagamentos, o que inclui zelar por um ambiente competitivo, pró-inovação e inclusivo”. Sobre o paradoxo do duplo chapéu, nenhuma palavra.

Em relação ao seu papel no PIX, o Banco Central disse ao RR “que atua de forma neutra” e “as instituições participantes ofertam os mais variados serviços, de forma competitiva, aos usuários finais”. Como se fosse possível, a autoridade monetária ser um agente neutro. O PIX aumenta, sim, a concorrência. Ponto pacífico. Mas, por outro lado, com ele, o BC acaba por interferir no sistema financeiro, criando uma dependência obrigatória para todos os agentes. Qual é o limite? O próprio Banco Central deveria ser o primeiro a dizer até onde pode, quer e, sobretudo, deve chegar com o PIX.

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