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Fragilidade de tradings abre espaço para agronegócio avançar na comercialização

  • 30/01/2024
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O escândalo contábil da ADM, nos Estados Unidos, traz a reboque um risco e uma oportunidade para o agronegócio brasileiro. No curto prazo, a investigação sobre supostas irregularidades na gigante norte-americana acende um sinal de alerta entre os grandes bancos internacionais. Até que o receio de uma crise sistêmica no segmento se dissipe, as instituições financeiras deverão adotar critérios mais rígidos na liberação de recursos, com impacto sobre a oferta global de crédito para as trading companies.

Trata-se de um efeito cascata preocupante para o setor agrícola no Brasil, devido ao possível impacto sobre o financiamento dos contratos de exportação. Esse é o copo meio vazio. Em contrapartida, de acordo com especialistas ouvidos pelo RR, dentro da má notícia há uma boa nova. O abalo da ADM deve acelerar um processo de fragilização das tradings que já se anunciava, até então em ritmo mais lento.

Esses potentados globais seguirão tendo um peso expressivo no financiamento de exportações e na circulação mundial de commodities agrícolas, mas com uma participação relativa menor. Nesse jogo de ocupação de espaços, nada mais natural que o Brasil, quarto maior produtor de grãos do mundo e responsável por mais de metade do mercado internacional de soja, seja um dos potenciais beneficiados. Esse fenômeno abre caminho para o agronegócio brasileiro avançar algumas casas e conquistar um terreno maior na cadeia comercial, apropriando-se de um negócio que hoje está majoritariamente nas mãos da própria ADM, Bunge, Louis Dreyfus, Cargill, entre outros. Ou seja: há uma oportunidade da “lavoura”, leia-se os próprios originadores, assumir ao menos uma parcela do processo de frete e colocação do produto no mercado internacional, absorvendo margens que hoje são contabilizadas pelas tradings.

Essa metamorfose, ressalte-se, não vai ocorrer de um dia para a noite. Trata-se de um rearrumação gradativa de participações entre os elos da cadeia global do agronegócio. Mas, de um lado ou de outro, há uma interseção de fatos e circunstâncias que empurram o setor nessa direção. Por parte das tradings, as supostas irregularidades contábeis da ADM, que já levaram o grupo a perder mais de 20% do seu valor de mercado, não são um ponto isolado de vulnerabilidade do setor.

Outro exemplo impactante é a Mercon Coffee Group, sediada na Holanda. A empresa, uma das maiores comercializadoras de café do mundo, entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos, com uma dívida de quase US$ 400 milhões. No passado recente, a Louis Dreyfus vendeu 45% de suas ações para a ADQ, companhia de investimentos de Abu Dhabi – operação interpretada no mercado menos como uma oportunidade de negócio e mais como uma busca forçada de capital.

Na mão contrária, já é possível verificar avanços de originadores de grãos sobre outras casas do tabuleiro. No Brasil, por exemplo, o empresário Antônio Francischini, um dos maiores produtores de café do mundo, comprou recentemente 63% da Ipanema Coffees, grande exportadora de grãos. Não é de hoje que os grandes bancos vêm apertando as linhas de financiamento para tradings.

Na média, estas empresas operam hoje com uma alavancagem de 18 a 30 – ou seja, US$ 18 a US$ 30 em crédito para cada dólar de capital das tradings companies. Há cerca de 30 anos, notadamente no segmento de café, esse índice chegou a ser de 120 para um. Para que os produtores possam ocupar esse espaço, uma nova estrutura de crédito terá de ser construída no tempo. Ressalte-se que, no agronegócio, não é tão simples financiar a origem.

Pelas regras do BIS, o “Banco Central dos Bancos Centrais”, o crédito para o setor agrícola exige um nível de provisionamento maior, dados os riscos do negócio. O mesmo não ocorre nas linhas de empréstimo para tradings, considerado um crédito comercial. No caso específico do Brasil, a falta de grau de investimento também é um entrave.

Por essas razões, no melhor dos mundos, caberia ao governo dar um empurrão, via subsídios, para que o produtor possa avançar sobre o latifúndio das trading companies na colocação de commodities no mercado internacional. Um exemplo: o Funcafé tem cerca de R$ 4 bilhões para financiar a cafeicultura no campo. O descolamento de algo como 20% desse funding para financiar contratos de exportação já representaria um fôlego da ordem de R$ 800 milhões. Ou seja: no futuro, para que o agronegócio brasileiro possa ampliar seu raio de ação e incorporar margens das tradings, além do “Plano Safra”, um “Plano Entrega” viria muito a calhar.

#ADM #Bunge #Cargill #Louis Dreyfus

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