A tristeza do general Heleno com o fim do blefe

  • 6/04/2021
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Se tem alguém no entorno do presidente Jair Bolsonaro que ficou desolado com a convulsão envolvendo o Ministério da Defesa e as Forças Armadas foi o general Augusto Heleno. Foi Heleno que costurou o “dispositivo militar” do governo Bolsonaro, constituído por um ministério palaciano formado por generais quatro estrelas em volta do presidente – estes, por sua vez, com relações pessoais e muitas vezes quase fraternas com os generais do Alto Comando, tendo, na origem, como pivô de toda a construção o general Eduardo Villas Bôas, ícone do Exército. Foi Villas Bôas quem iniciou, com toda a sua autoridade, o blefe, ainda no governo Temer, ameaçando o mundo político caso o STF concedesse habeas corpus para o ex-presidente Lula. Ganhou um cargo nobiliárquico no Planalto, no governo Bolsonaro, já sem condições de trabalho, devido a uma doença degenerativa.

O blefe não era mais do que uma ameaça permanente, ainda que tácita, de um golpe militar inexistente. Constituía em nada mais do que a repetição permanente por Bolsonaro do apoio militar qualquer que fosse sua ação administrativa ou política. Foi Heleno quem sistematizou o blefe do golpe. O ministro do GSI foi também quem aparou todas as manifestações contrárias à estratégia de “colar” Bolsonaro nos militares, a exemplo do general Santos Cruz, que, quando estava na Secretaria de Governo da Presidência, trabalhou contra o discurso construído pelo general decano. Heleno esteve por trás da demissão de Sérgio Moro e do alerta sobre Mauricio Valeixo, enclave de Moro na Polícia Federal. No final da história, havia apenas um frágil fio condutor entre generais legalistas, cuja indicação tinha sido feita pelo general Fernando Azevedo e Silva, também legalista, indicado pelo general Heleno, o fiador de Bolsonaro no “dispositivo” do blefe.

O fio da meada do “contragolpe” do blefe começa com uma gravação enviada a Heleno sobre uma conversa de Azevedo com o presidente STF, Luiz Fux, na qual este último consultava, em linhas gerais, sobre a “segurança institucional” do país. Azevedo tranquilizou Fux, dizendo que as Forças Armadas cumpririam sua missão democrática e constitucional. Heleno não aceitou que a conversa não tivesse sido combinada antes, entre ele e Azevedo. Havia e há uma suspeição de que o STF é quem daria o golpe, sustentando que o Artigo 79 da Constituição era largo o suficiente para enlaçar Bolsonaro consigo. Heleno e Braga Netto, então, chamaram para si a missão de comunicar a Azevedo o seu afastamento. Foi quando Heleno deu um tiro no próprio pé. Com o “contragolpe” do blefe, o ministro Heleno, o mais ouvido dos generais entre os oficiais superiores lotados no Planalto, ficou, digamos assim, “vendido”.

A saída dos chefes das Forças Armadas, em silêncio, sem justificativa pública, desmontou a engenharia do ministro do GSI. Seu movimento final foi o acerto para que a retirada dos comandantes militares fosse atribuída a uma demissão feita por Bolsonaro e não a uma renúncia de protesto, o que efetivamente ocorreu. Heleno também esteve por trás do reaparelhamento da Defesa, com a nomeação, ato contínuo, do general Braga Netto. A indicação não significa a volta do status quo. Braga Netto vai acalmar os Altos-Comandos, com sua notória respeitabilidade, e não há dúvida de que a hierarquia será respeitada. Mas os integrantes dos Estados Maiores das Forças sabem muito bem o que houve e não querem ser associados a Bolsonaro. O “dispositivo” do blefe, portanto, não será reconstruído, pelo menos com as três Forças.

O simbólico evento da renúncia coletiva dos comandantes militares deixou para dentro a forte mensagem de que havia utilitarismo no uso da imagem das Forças Armadas. O novo comandante do Exército, general Paulo Sergio, é adepto desse pensamento. Ou seja: a primeira fortificação de defesa de Bolsonaro caiu, de uma forma que Heleno não podia imaginar. Mesmo porque não passava de uma linha imaginária. A tristeza e a solidão do general Heleno neste momento são proporcionais ao crepúsculo da sua relevância para a blindagem institucional do presidente Jair Bolsonaro.

 

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