O dia em que o dólar bateu nos R$ 4

  • 12/03/2015
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Em um dia qualquer de maio, junho ou julho, o extraordinário Orson Welles, que, em 1938, apavorou a Costa Leste dos Estados Unidos ao narrar pelo rádio uma suposta invasão de marcianos, incorporou em um brasileirinho. O guri, vendedor de jornais, bravejava pelas ruas da cidade com a voz tonitruante de Welles: “Extra! Extra! O dólar chegou aos R$ 4.” O overshooting já se delineava desde o princípio de março com a moeda alcançando os R$ 3,15. Desde então, os extraterrestres invadiram o mercado de câmbio. Tudo ao mesmo tempo agora. Standard & Poor’s, Moody’s e Fitch rebaixaram o rating do Brasil. O Federal Reserve retirou os estímulos monetários de uma forma mais agressiva do que a prevista. Bancos internacionais recusaram as baixas contábeis no balanço da Petrobras, que teve de antecipar pagamentos dos seus débitos para não entrar em default. O Banco Central se viu forçado a vender US$ 50 bilhões das suas reservas cambiais, que baixaram para algo em torno de US$ 320 bilhões. A queima de moeda física foi necessária devido ao insucesso do lançamento de US$ 35 bilhões em swaps cambiais, cujo estoque saltou de US$ 113 bilhões, em março, para US$ 148 bilhões, o equivalente a 46% das reservas. Esse movimento de redução do lastro cambial, em vez de acalmar o mercado, deixou-o frenético. As remessas de lucros atingiram US$ 16 bilhões – o correspondente a 61% do valor total de 2014 -, com as empresas preocupadas que o dólar não tenha teto. O temor de um ataque especulativo atingiu o governo na fronte. Antes disso, o BC já tinha puxado a Selic para 18%, com viés de alta, em reunião extraordinária do Copom. O INPC anualizado ultrapassava os 10%, segundo previsão das instituições do mercado. De repente, o Brasil empobreceu de forma brutal. O valor de mercado das companhias abertas caiu de R$ 2,1 trilhões para R$ 1,5 trilhão. A título de comparação, trata-se do equivalente a 6,8 vezes as baixas contábeis de R$ 88 bilhões do balanço bastardo da Petrobras assinado por Maria das Graças Foster. A dívida privada em moeda estrangeira subiu de R$ 651 bilhões para R$ 826 bilhões. A Petrobras, que, de alguma forma, estava na origem do cataclismo, viu seu valor de mercado desabar de R$ 111 bilhões, em meados de março, para R$ 81 bilhões. Ou seja: mais do que o orçamento do Bolsa Família inteiro em 2014 (R$ 25 bilhões). Começaram a surgir boatos por toda a parte de que operações de hedge malsucedidas, a exemplo do que ocorreu no passado com as finadas Aracruz e Sadia, pululavam no mercado como lambaris no rio. Num intervalo de 15 dias, Joaquim Levy já havia contabilizado 27 entrevistas a diversos veículos garantido a firmeza do ajuste econômico. O alto-comando do governo reuniu-se com a presidenta Dilma Rousseff para decidir se ela faria um pronunciamento de rádio e TV em caráter emergencial. Xô, Orson Welles! Como se já não bastasse a realidade…

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