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O escândalo contábil da Americanas está empurrando o Itaú e o Santander para o mesmo lócus onde foi incubada a Lava Jato: o Ministério Público Federal. De acordo com informações filtradas pelo RR, o MPF vai abrir um procedimento para apurar as denúncias contra os dois bancos feitas pelo ex-diretor financeiro da rede varejista Fabio Abrate em sua delação premiada. O órgão deverá pedir à Justiça que determine uma auditoria para averiguar uma eventual participação do Itaú e do Santander na fraude contábil da Americanas.
Em seu depoimento ao Ministério Público, Abrate acusou as duas instituições financeiras de terem escondido dados referentes às operações de risco sacado, informações estas que deveriam constar das chamadas cartas circulatórias enviadas à auditoria da empresa. Segundo o executivo, a cumplicidade do Itaú e do Santander se deu após a Americanas ameaçar romper contratos com os bancos. Em seu depoimento, Abrate chega a dizer que a fraude poderia ter sido estancada em 2016 caso os dois bancos tivessem se negado a camuflar a trapaça contábil.
Consultado pelo RR acerca da instauração de um processo investigatório contra o Itaú e o Santander, o MPF não quis fazer comentários, alegando que “o processo encontra-se sob sigilo”. Também procurado, o Santander não se pronunciou. O Itaú, por sua vez, “nega qualquer participação, direta ou indireta, na fraude contábil que a Americanas sofreu.
O banco sempre prestou às auditorias e aos reguladores informações corretas e completas sobre as operações contratadas pela empresa, conforme legislação vigente e melhores práticas de mercado. Conforme já esclarecido, os informes enviados às auditorias sempre alertavam para a existência das operações de risco sacado e da exposição de crédito da companhia aos fornecedores”. Ainda segundo o banco, “os diretores da Americanas envolvidos na operação interagiram com representantes do Itaú no sentido de retirar os alertas, como admitiu o ex-diretor Fabio Abrate em seu depoimento.
O banco nunca concordou com esse pedido e, diferentemente do que informou Abrate, manteve o texto que sinalizava a exposição da companhia ao risco sacado. O Itaú, inclusive, interrompeu, por mais de 6 meses, as operações de risco sacado. O Itaú reforça que a elaboração das demonstrações financeiras é de responsabilidade única e exclusiva da administração da empresa e repudia qualquer tentativa de responsabilização de terceiros por falhas ou fraudes nessas demonstrações.”
Investigações como esta sabe-se como começam, mas nunca onde podem terminar. Um dos maiores fatores de apreensão para o Itaú e o Santander, neste momento, é que as acusações feitas por Fabio Abrate venham a ser corroboradas por outros ex-executivos da Americanas. Até o momento, dos 13 antigos dirigentes da rede varejista denunciados pelo Ministério Público Federal, três já fecharam acordos de delação premiada – além de Fabio Abrate, estão nesse rol Marcelo Nunes, ex-diretor executivo financeiro, e Flávia Carneiro, ex-diretora executiva de controladoria. Esse número pode crescer.
Segundo uma fonte do MPF, outros dois ex-executivos da empresa abriram tratativas para também firmar um acordo de delação. Colaboração premiada está longe de ser um instrumento imune a narrativas farsescas. A história recente no Brasil mostra que sempre há o risco de o delator criminalizar terceiros com acusações infundadas para livrar a própria pele – um exemplo momentoso é a delação do tenente-coronel Mauro Cid, que mudou cinco vezes.
Caberá ao Ministério Público e à Justiça dizer se este é ou não o caso de Fabio Abrate. No entanto, a simples acusação feita pelo executivo já é suficiente para ter um impacto brutal sobre a reputação do Itaú e do Santander e colocar em xeque a estrutura de compliance de ambos.
No caso específico do Itaú, o timing da acusação é ainda mais doloroso.
A denúncia do ex-executivo da Americanas arde como arnica nas feridas já abertas no banco quando o assunto é compliance. Nos últimos meses dois casos atingiram em cheio a reputação e o orgulho dos Setúbal. O Itaú demitiu o executivo Alexsandro Broedel Lopes, que ocupava o cargo de diretor financeiro, sob acusação de violar “gravemente o Código de Ética da instituição”.
A instituição financeira encontrou “fortes indícios” de que Broedel era sócio de uma consultoria que prestava serviços ao banco. Segundo a própria instituição financeira, entre junho de 2019 e junho de 2024, Broedel contratou 40 pareceres da Care com um total de 21 pagamentos, no valor somado de R$ 13,255 milhões. Quase que no mesmo período, veio à tona a notícia de que o Itaú demitiu Eduardo Tracanella, até então chief marketing officer, por gastos pessoais e “inapropriados” em seu cartão corporativo.
São episódios graves, que, no mínimo, escancaram porosidades no compliance do banco da família Setubal. Mas nada que se compare a uma denúncia de cumplicidade com o maior escândalo contábil do Brasil, que agora paira sobre Itaú e Santander.
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