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Heineken e Petrópolis bebem do avesso da lógica

  • 30/10/2012
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Em condições normais de temperatura do chope e de pressão da serpentina, tudo levaria a crer que as propaladas negociações entre a Heineken e a Petrópolis terminassem, inevitavelmente, na venda da empresa brasileira. Mas, como dizia Hitchcock, a s vezes é preciso jogar a lógica pela janela para que a imaginação prevaleça. Neste caso, as gestões entre as duas companhias podem ter um desfecho surpreendente e resultar no surgimento de um bicho inusitado, totalmente inesperado, um ornitorrinco cervejeiro. Em vez da venda da Petrópolis para a Heineken, ocorreria uma fusão entre a empresa de Walter Faria e a operação dos holandeses no Brasil. Nesta genética feita de cevada e espuma, contrariando todas as previsões a Heineken seria a parte recessiva, ou seja, o sócio minoritário. Pela sua posição no mercado brasileiro, leia-se volume de vendas, número de fábricas e até mesmo valor intangível de suas marcas, caberia a  Petrópolis ser o gene dominante. As próprias circunstâncias do mercado deveriam empurrar as duas empresas nesta direção. Hoje, é muito difícil comprar a Petrópolis. Walter Faria goza de uma situação confortável. Tem levado vantagem na disputa particular com Kirin/Schincariol pelo segundo lugar do ranking do setor. Ao mesmo tempo, conseguiu imprimir um ritmo de expansão, leia-se, principalmente, a sucessiva construção de fábricas, que só valoriza o seu ativo. Ou seja: Faria pode esperar pela proposta das propostas das propostas. Não tem pressa. Muito menos a pressa que os holandeses têm. Gigante mundial do setor, a Heineken ainda joga como time pequeno no Brasil. Tem pouco mais de 5% de market share – menos da metade da participação da cervejeira brasileira. Sua operação por estas bandas resume-se praticamente a  Kaiser, o que não é exatamente o melhor dos cartões de visita. Agora mesmo os holandeses estão envolvidos em mais uma tentativa de reanimação da combalida marca, com ações que vão de financiamento para a expansão dos distribuidores a maiores investimentos nos pontos de venda. Por estas razões, a estranha espécie eventualmente criada a partir do cruzamento da Petrópolis com a Heineken poderia, por mais incrível que pareça, acomodar os interesses de parte a parte. Walter Faria permaneceria com o controle do negócio, como sempre foi seu desejo, com o bônus de ter um sócio de altíssimo teor financeiro ao seu lado. O acordo também funcionaria como uma operação cleaner, uma limpeza na imagem institucional da Petrópolis. A associação com a Heineken daria um verniz corporativo que a cervejeira brasileira nunca teve. Além disso, Faria ainda poderia tirar onda com o discurso de mais uma vitória da empresa privada nacional. Já a Heineken, ao mandar a lógica a s favas e se deixar engolir pela Petrópolis, daria um grande salto no Brasil. Praticamente triplicaria sua participação de mercado, com mais de 17%. Nada que ameace a liderança inconteste da AmBev. Mas a nova empresa se consolidaria como a vice-líder do setor, deixando os japoneses de Itu no meio da estrada, sob um colarinho de poeira. Os holandeses manteriam um acordo para garantir a distribuição de suas marcas em situação ainda mais vantajosa. Ao mesmo tempo, a Heineken preservaria sua estratégia geoeconômica de fincar bandeira nos mercados-baleia. Mas são tão diferentes as culturas e tantas idiossincrasias, que é mais provável que sobre muita espuma e pouca cerveja nesse copo.

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