A triste história do general que vendeu a alma

  • 19/04/2021
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O general Eduardo Pazuello é um homem eivado de mágoas com o que chama de “Brasil rasteiro”. Mas afirma que cumpriria novamente a missão de chefiar o Ministério da Saúde em uma situação de pandemia caso o seu comandante Jair Bolsonaro lhe delegasse a tarefa mais uma vez. Pazuello tem dito e repetido a interlocutores que confia inteiramente no presidente e tem certeza de que ele não lhe deixará ao léu, qualquer que seja a consequência da sua passagem pela Pasta. Pazuello tornou-se o primeiro general da gestão Bolsonaro processado pelo MPF e o mais espezinhado dos militares que participaram do atual governo. A despeito da fé professada pelo general em Bolsonaro, a herança que o Ministério da Saúde lhe rendeu é ser hoje um personagem estigmatizado dentro e fora das Forças Armadas. Ainda assim, Pazuello remói seus ressentimentos em silêncio, mantendo a obediência, a lealdade e o senso de hierarquia. Não pensa em se manifestar publicamente e tampouco cometer inconfidências.

Neste momento, ele aguarda uma definição sobre um novo posto no governo, preferencialmente no exterior, mesmo que essa hipótese não lhe confira foro privilegiado. Foi sinalizado também a Pazuello um cargo de chefia no Ministério da Infraestrutura. Como se sabe, o general é um expert em logística, ao menos em logística militar. Caso este seja seu caminho, Pazuello se alinharia com as hostes do governo opositoras a Paulo Guedes, leia-se Tarcísio Freitas e Rogério Marinho. De uma certa forma, o general seria o aliado militar dos dois ministros que mais defendem obras no governo. Seja qual for o destino do oficial, a CPI permanece à espreita em alguma esquina do seu futuro. Pazuello está indexado a Bolsonaro assim como Bolsonaro está indexado a Pazuello. Se e com que impacto a CPI vai atingir o presidente é algo que depende muito da postura do general. Ressalte-se que o TCU já produziu um relatório sobre a ação do Ministério da Saúde na pandemia com conclusões devastadoras para Pazuello.

O general Pazuello sofre pela sensação de ter sido duplamente castigado. Desde que voltou ao Exército, está encostado em um cantinho da corporação, sem ter sido designado para uma nova função. Esse cenário de isolamento em relação aos seus pares, ressalte-se, não vem de agora. Quando a pandemia se acentuou e as acusações de negligência começaram a pairar sobre sua cabeça, o Alto-Comando do Exército pressionou Pazuello para que ele deixasse o Ministério ou passasse à reserva. Há relatos de desgaste com o comandante da Força, general Edson Pujol. Na última quinta-feira, por sinal, durante a posse do novo chefe do Comando Militar do Sudeste, Pujol disse que o Exército foi o principal instrumento do governo no combate à pandemia. Sintomaticamente, não citou o nome de Pazuello.

A saída do Ministério da Saúde serviu para amplificar decepções anteriores, que o general carregava antes mesmo de assumir o posto. Ao deixar o comando da Operação Acolhida, em Roraima, no fim de 2019, Pazuello dava como certa sua tão almejada promoção, que seria revestida de um forte valor simbólico. Na história do Exército Brasileiro, Pazuello passaria a ser o primeiro oficial egresso da Intendência, leia-se a área de logística do Exército, a chegar a quatro estrelas. A rigor, hipoteticamente, esta possibilidade ainda está em aberto, uma vez que ele permanece na ativa. Mas, na atual circunstância, é uma aposta perdida.

Após a saída de Nelson Teich do governo, Pazuello, então secretário-executivo da Pasta da Saúde, recebeu de Bolsonaro a garantia de que ocuparia o cargo de ministro interinamente até que se chegasse a um novo nome. Ocorre que o novo nome acabou sendo ele mesmo, e a “interinidade” durou dez meses. Por tanta lealdade, foi “recompensado” com a pecha de incompetente, algo que não se coaduna com o seu currículo e as funções que desempenhou nas Forças Armadas, entre elas a coordenação das tropas do Exército na Rio 2016. Mas, hoje, tudo se resume a sua descalibrada trajetória no Ministério da Saúde. Por ora, Pazuello é um general de três estrelas foscas e criminalizado pela fidelidade a Bolsonaro. É uma história triste.

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