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O furacão Trump vem incomodando e irritando a Deus e a todo mundo, desde que ele ganhou a eleição, provocando animosidade e revolta. Mas o fato real é que sua arrogância não conseguiu esconder as fraquezas cravadas em sua própria testa: “Make America Great Again”. Parece que o império americano, que já foi tão grande, deixou mesmo de ser. Assi como parece que Trump se tornou a busca da dignidade perdida. Dificilmente os Estados Unidos voltarão a ser tão grandes quanto no passado, e o “Maga” não é apenas uma frase de efeito, mas o sinal de debilidade que vinha se agravando por surtos desde o início dos anos 70.
O fato paradoxal é que a globalização dos anos 90, que deixou o Brasil de calças curtas, pode ter sido o último soluço de grandeza do império americano, que brotou dos escombros da velha União Soviética como o momento triunfal do liberalismo e da democracia. É surpreendente. Parece que a globalização americana deu errado… para os americanos! Mesmo com o enriquecimento colossal das big techs. Não obstante o poder mundial do capital financeiro, os Estados Unidos se protegem graças às lamúrias de Trump no altar dos sacrifícios de um liberalismo que parecia triunfal. Agora, ele o líder está tentando se livrar da ordem global a picaretas, quem sabe para inventar uma outra que lhe pareça melhor.
A demolição das instituições globais provoca protestos e revoltas, mas, para nós, brasileiros, pouco há do que lamentar. A globalização foi a grande madrasta do Brasil e não temos por que chorar no seu enterro, e muito menos no altar dos sacrifícios de um multilateralismo que pouco fez por nós. Na verdade, muita coisa permanece errada no multilateralismo tosco das Nações Unidas: as guerras incontroláveis e fratricidas que prosperam sob o olhar complacente do Conselho de Segurança da ONU; o acordo global sobre as mudanças climáticas, que já vem se arrastando há décadas sem produzir nenhum resultado; e o planeta Terra que já alcançou 1,5oC de aumento da temperatura global, ultrapassando o seu limite e aproximando-se de uma calamidade global.
Também pudera: seis países do mundo são os grandes poluidores que não assumem sua responsabilidade, enquanto os quase 200 restantes não emitem nada. Apenas participam como figurantes e vítimas que não mandam nada. É a tragédia dos Commons que respondem pelos crimes de uma minoria que tem poder de veto. As decisões são tomadas por unanimidade nesse falido sistema multilateral! Ninguém lamenta o morticínio que continua no coração da África. E o Haiti, continua violento, ignorando as tentativas frustradas das Nações Unidas de organizar o caos.
No caos da Era Trump estamos cercados pelo inesperado e pelas incertezas. Às vezes positivos. A última surpresa foi assistir ao ressurgimento no Brasil do pulsante nacionalismo que há muito parecia ter sido enterrado pela globalização. E o mais curioso é que este nacionalismo se espalhou no espectro político brasileiro, cobrindo de A a Z e chegando até os redutos do povão. Ouvimos daqui e dali vozes de admiração por uma “Embraer é nossa” e que trouxe de volta o orgulho perdido. Até o presidente Lula vem declarando solenemente que “o Brasil é nosso e nossos minerais estratégicos não estão à venda. Uma boa intenção logo desmentida por seu angustiado e menos patriótico ministro da Fazenda. Os minerais estratégicos, afinal, estão ou não estão à venda?
Há muito tempo que nossos pensadores apontam a importância de dar maior valor agregado à exploração de nossos recursos naturais. Helio Jaguaribe desde os anos 50 falava em diversificar essa produção agroextrativista e aumentar sua produtividade, acumulando assim capital para promover outros investimentos mais caros e complexos. Como secretária executiva do Meio Ambiente, ainda nos anos 90, adaptamos esta linguagem aos novos tempos: precisamos fazer o casamento feliz entre a biodiversidade e a biotecnologia. O estoque de biodiversidade é o nosso bem mais precioso, pois somos um país megadiverso, o mais diverso do mundo. Esta riqueza natural que cantamos em prosa e verso desde nossas origens, louvando o verde de nossas matas e a riqueza de nossos minérios, agora se converteu em um precioso ativo para gerar recursos e enriquecer o país, desde que possamos ligar a biodiversidade aos ganhos da biotecnologia. Como todos sabemos esta é a esfera mais inovadora e criativa da revolução tecnológica mundial.
Mas há agora um novo nicho que se abre de maneira promissora: a geoeconomia marinha, isto é, a economia do mar, de valor incalculável que temos em superabundância e que desperta o interesse de todos os países sábios e espertos do mundo. Nossos maravilhosos cientistas estão fazendo milagres, explorando as possibilidades genéticas das espécies marinhas e descobrindo sua capacidade regenerativa. Trabalham com muita inteligência e capacidade de inovar, mas com raros, raríssimos recursos porque o governo prefere alocar o pouco que tem no lugar errado.
Lançamos recentemente, com a brilhante colaboração da revista Insight Inteligência (https://insightinteligencia.com.br/), uma campanha para que o Brasil evolua do pré-sal ao “pré-mar”. É isto mesmo. Queremos e podemos liderar este processo. Por enquanto, porém, na lista dos países sábios e espertos não está o Brasil, mas, sim, Noruega e China, maior produtora de pescado do mundo. O Brasil não está na lista dos demais. Somos sempre um pouco lerdos, mas, se quisermos, podemos ser a superpotência em bioeconomia no mundo, pelo menos na relação dos dez mais!
E agora surge uma extraordinária oportunidade criada, pasmem todos, pela China e não pelo Brasil. No seu radar em busca de rápidas respostas à crise internacional, chegou hoje ao Brasil uma delegação chinesa disposta a abrir o seu mercado para os peixes brasileiros. Esta é a oportunidade que temos para produzir mais e melhor, usando tecnologia avançada e pesquisadores de altíssimo gabarito, para promover e reativar a indolente economia nacional. Vamos lá!
Esta leva de recursos marinhos pode permitir a produção de alimentos: peixes, vieiras finíssimas, camarão etc. Podemos fabricar cosméticos de alto valor agregado que custam os olhos da cara. Podemos promover corais que reproduzem naturalmente as espécies marinhas e que descarbonizam os oceanos, hoje caminhando para a fase terminal. Podemos ser os salvadores do planeta ao produzir algas que são, além de fertilizantes, espécies que absorvem carbono. Seu preço vem subindo no mercado. A Costa do Rio de Janeiro está pronta para descobrir esses produtos.
Terminando por onde comecei: corremos o risco de exportar, como sempre, nossos produtos sem maior valor agregado e depois receber os peixes de volta processados industrialmente. Foi assim com a soja. Não podemos repetir a experiência. O perigo é esse: ficar onde sempre estivemos. Na periferia das grandes potências. E ainda nos arriscamos de comprar do país que industrializa o produto aquilo que nós produzimos. Eita, Brasil!
Aspásia Camargo é colaboradora especial do Relatório Reservado
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