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PEC dos precatórios é um eufemismo para calote

19/08/2021
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Em meio à barafunda fiscal, o RR considera que vale a pena destacar trecho da edição de agosto do boletim Prospectiva Econômica, produzido pela Insight Comunicação, sobre a questão dos precatórios. As informações não chegam a ser novas, mas o que elas revelam chama a atenção:

  • Do ponto de vista fiscal, o governo tem de lidar com R$ 90 bilhões em precatórios, a pagar já em 2022, o que bagunça o orçamento e o teto de gastos. A decisão já foi transitada em julgado no Supremo. Parece um passivo saído de uma caixa de pandora. Mas, não, o passivo sempre esteve nas previsões da Secretaria do Tesouro, que esperava postergar sua saída da toca do Judiciário. O que faltou, conforme confissão do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi o acompanhamento da questão pelo governo.

 

  • Agora, o governo pode se ver obrigado a adotar medidas contrárias ao seu ideário, quer seja uma “pedalada fiscal”, com a proposta de Emenda Constitucional que cria um fundo com receitas de privatizações, ou a venda de imóveis e dividendos de estatais remanescentes, fora do teto de gastos. Mesmo que a iniciativa seja constitucional, Paulo Guedes passa a sofrer do dilema da mulher de Júlio Cesar: não basta ser honesta, é preciso parecer honesta. Guedes deixou de parecer o neoliberal autêntico ou o fiscalista de quatro costados, conforme sempre se autodefiniu. No fundo, ao dizer que preferiu adotar essa medida ao não cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal ou a Regra de Ouro, comunicou, com outras palavras, que preferia jogar às favas os escrúpulos a ser preso.

 

  • Os pedaços da PEC que vazam do Palácio do Planalto são confusos. Em uma versão, a Emenda prevê a transferência obrigatória de 20% desse fundo para pagar as dívidas com os precatórios; outros 20% dos recursos serão pagos permanentemente aos mais pobres; além da destinação, até 2029, de 2,6% da Receita Corrente Líquida da União. Essa não é a única narrativa. Não se sabe se a tal “fundação” englobará a receita de concessões, os ativos das estatais enquanto não forem privatizadas ou somente as receitas de privatização. Tampouco se tem conhecimento se os imóveis serão vendidos preferencialmente aos novos controladores das empresas privatizadas e o quanto vai se abater da dívida bruta interna da União. Também não está claro se algum repasse será feito para contenção dos débitos de estados e municípios.

 

  • O teto de gastos formalmente  não será mexido. A medida de criar orçamentos extraordinários criativos vem sendo defendida por Insight Prospectiva desde sua primeira edição. A predição foi cumprida da pior maneira: um “jeitinho” para o parcelamento unilateral de uma dívida com a qual o Ministério da Economia admite, sem pruridos, não poder arcar. É como se o governo diferisse, arbitrariamente, o pagamento dos títulos públicos. Há um lado bom, que é a destinação de parte dos recursos à população excluída. Faltou, no entanto, carimbar o quanto iria para as despesas públicas com investimentos. O governo, porém, não pensa nesse assunto. O fato é que um ato soberano, que deveria se tornar uma válvula de escape para os gastos na infraestrutura e a mitigação da dor e da pobreza, surgiu como uma ação covarde para driblar o nome de moratória do que, evidentemente, é um calote.

 

  • O fato é que o fôlego fiscal foi reduzido. O mercado, conforme já se viu, não perdoa. É consenso que até as eleições a racionalidade econômica cederá à demanda política pelos recursos escassos. Mas, se pensar bem, o “grande atraso” pode até significar um pequeno avanço, na medida em que quebra um dogma da política econômica: a de que não é possível arrumar dinheiro para despesas essenciais ao país fora do teto de gastos. Por enquanto, o que sobressai no fundo do calote institucionalizado é o dito de Paulo Guedes: devo, não nego e pago quando puder.

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