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Brasil
Agora só falta um pacto dos ricos contra a pobreza
29/08/2024A carta aberta intitulada “Pacto econômico com a natureza”, divulgada ontem nos veículos online e hoje em jornais impressos e assinada por aquinhoados empresários – entre os quais alguns industriais de estirpe, banqueiros acadêmicos e herdeiros biliardários – é uma iniciativa louvável. Ela revela explicitamente que o empresariado de maior peso não está de costas para a questão climática. E se propõe a participar ativamente de um plano “para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas.” Não é pouca coisa. Mas a proposta de unir os Três Poderes parece um desafio maior do que acabar com todos os incêndios da Amazônia e do Cerrado, além do morticínio de outros biomas.
Tentar reagir ao risco de um desastre climático é, no mínimo, elogiável, e cabe mesmo às nossas elites assumirem a liderança dessa missão hercúlea. Porém, faltaram alguns parágrafos no texto. Assim como o meio ambiente é uma ameaça para ontem, a concentração de renda é um conflito para já, com um potencial de crescimento mais rápido do que o prazo do superaquecimento terrestre. Se, em 30 anos, estaremos todos fritos pelo calor cáustico, em cinco anos é líquido e certo que os donos da riqueza global, ínfimo 1% da população, ficarão ainda mais ricos. Ou seja: os 99% mais pobres serão ainda mais pobres.
A questão da riqueza excludente de uma absurda parcela de “desendinheirados” consta de forma tímida dos três pilares da agenda da reunião de cúpula do G20, no próximo mês de novembro, no Rio de Janeiro. As maiores nações do mundo parecem não considerar com a mesma relevância a relação dos temas de concentração de renda com a pobreza, miséria e “as milhares de crianças abandonadas junto a um cadáver de mãe” (apud Vinícius de Moraes). Tem sido sempre assim desde o pós-Segunda Guerra. Vide as condições da África, o chamado continente perdido. A próxima COP provavelmente repetirá a ausência da ausência. Se o mundo couber em uma mão dos mais ricos, isso não será um milésimo da preocupação dos países centrais e emergentes, das agências multilaterais e do próprio empresariado com a descarbonização. O clima ameaça a todos, mas o dinheiro em poder de uma molécula da sociedade é só um detalhe, Repita-se: a iniciativa de chamar a atenção para o desastre climático merece aplausos – as loas mais entusiásticas ficam para quando fizerem algo de concreto. Mas, tendo em vista o padrão de renda dos signatários, algumas linhas sobre a absurda concentração de renda e a desesperança dos excluídos – transformaria a carta aberta em uma atitude humanitária de ajoelhar e rezar. Fica a dica para um futuro manifesto. Aliás, segue outra dica. Melhor não usar a palavra pacto, que, no Brasil, sempre foi um convite à inação. Como dizia o Dr. Ulysses, “não mencionem pacto, porque vai virar pato”.