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Inseticida da Bayer não faz mal nem a um mosquito
26/12/2019Rua Domingos Jorge 1100, São Paulo. Simbolicamente, este endereço abriga um dos maiores focos de dengue do país. Trata-se da sede da Bayer Brasil, co-protagonista, ao lado do Ministério da Saúde, do que pode vir a ser uma crise de razoáveis proporções na saúde pública. A poucos dias do início do verão, diversas secretarias estaduais têm alertado o governo federal sobre a falta de inseticida para o combate ao Aedes aegypti, transmissor da dengue, da chikungunya e da zika. Há algo no ar além dos mosquitos de carreira.
Por trás da escassez do produto existe uma estranha história, na melhor da melhor das hipóteses, de malversação do dinheiro público. Entre 2016 e 2019, o Ministério da Saúde comprou da Bayer, por intermédio da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), cerca de um milhão de litros do inseticida Malathion, segundo testes capaz de matar qualquer outra coisa, menos Aedes aegypti. A substância foi considerada imprópria pelas Secretarias Estaduais. Laudos mostraram que o inseticida chegava até mesmo a danificar as máquinas de aplicação, o popular fumacê. Após mais de três anos de relação comercial contínua, sem que se ouvisse um zumbido de mosquito em relação ao contrato, agora o governo federal e a Bayer tentam empurrar a responsabilidade um na direção do outro.
Consultado, o Ministério da Saúde confirma que “desde maio de 2019, o Brasil está desabastecido do inseticida Malathion devido a uma grande quantidade de produtos vencidos e com problemas de qualidade em razão de alterações químicas”. Informa ainda que, “por conta deste problema, a Bayer já recolheu 105 mil litros do produto”. Diz também que a empresa alemã repôs ao armazém do Ministério da Saúde 25 mil litros. Ainda segundo a Pasta, “as análises de qualidade dos lotes remanescentes, aproximadamente 80 mil litros, realizadas pelo Laboratório Ecolyzer, apresentaram desconformidades nos resultados.”
A Bayer, por sua vez, afirma que apenas comercializa o inseticida Komvektor (cujo princípio ativo é o Malathion) – a substância é fabricada pela FMC/Cheminova. O conglomerado alemão desdiz o governo e assegura que “os produtos fornecidos ao Ministério da Saúde estão em condições adequadas para uso, conforme laudo técnico da fabricante, o que deverá ser comprovado por nova análise a ser realizada, dessa vez seguindo os critérios de qualidade estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde”. Mas admite que “decidiu substituir, em caráter voluntário, 206,4 mil litros do produto, sendo que 105,6 mil litros já foram entregues ao Ministério da Saúde e outros 100,8 mil litros chegarão ao país até o final do ano.”
A esta altura do calendário, todas as secretarias de Saúde já deveriam estar com seus estoques de inseticida devidamente preparados para o verão. No entanto, segundo o RR apurou, o produto está praticamente zerado em Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e Paraná. O Ministério da Saúde garante que a primeira remessa da devolução feita pela Bayer já começou a ser distribuída a Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Piauí e Rio de Janeiro. Trata-se do cinturão do Aedes aegypti, estados que apresentam maior risco de casos de dengue, zika e chikungunya. De toda a forma, ao que tudo indica, a Bayer vai ficar pelo caminho. Segundo o Ministério, o governo federal já adquiriu 300 mil litros de um novo produto, o Cielo, que vai substituir o Malathion. A previsão de entrega é até fevereiro de 2020.