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Política

Lula faz da posse de Mercadante o “8 de janeiro da política monetária”

7/02/2023
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Um dos ensinamentos do ex-ministro Mario Henrique Simonsen era o seguinte aforismo: “Quem não tem o que dizer não tem nada que falar”. Lula não deve ter lido ou ouvido Simonsen. O presidente está falando sobre o que não sabe e não deveria dizer sobre Banco Central independente, juros, câmbio e meta de inflação. O terreno é sensível e envolve uma corrente de transmissão terrível para os mais pobres: baixar a Selic no grito aumenta os juros futuros, afasta os investidores e deprecia o câmbio, o que eleva a inflação.  

Desde o início do seu mandato, o impacto das declarações de Lula sobre política monetária e meta de inflação nas mídias foi muito superior ao das declarações moderadas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, buscando apagar os incêndios. Segundo levantamento exclusivo feito pelo RR, as declarações de Lula descendo a lenha no target de inflação geraram 7.102 notícias desde a posse, contra 2.739 de Haddad tentando acalmar a fúria do patrão. Com relação à Selic, foram 1.884 notícias com o presidente dizendo que os juros teriam de ser reduzidos na marra porque “são uma vergonha”, contra 253 matérias de Haddad tratando suavemente do nível da taxa básica.  

Lula fala da ata do Copom e do relatório de inflação do BC. Ele não entende do assunto e nunca leu qualquer uma dessas peças. As intenções do presidente podem até ser boas. Os juros do Brasil estão entre os cinco maiores do mundo há décadas – atualmente estão em 1° lugar. Deveriam, sim, ser motivo de um debate acadêmico consistente. Mas isso teria de ser feito sem arroubos e não com gritaria no auditório do BNDES, como Lula fez, ontem, durante a posse de Aloizio Mercadante.  

Lula descasca também a meta de inflação. Outro assunto que não foi feito para ser tratado pela Presidência da República. A meta deveria ser revista, sim. O RR, aliás, tem batido nesta tecla há tempos. Alguns dos maiores especialistas em política monetária defendem a iniciativa. Mas o assunto não deve ser motivo de bravata. Todas essas questões não podem ser antecipadas. Não há por que falar sobre meta de inflação excitando os mercados. Se o CMN (Conselho Monetário Nacional) entender que ela deve ser mudada, troca-se a meta e pronto. Sem alarido prévio.  

Os juros, por sua vez, não são um desejo pessoal do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. A fixação da Selic é resultante da análise de um modelo que roda centenas de variáveis no campo macroeconômico. O acompanhamento da evolução dos preços de cada produto pelo BC é mais amplo do que a apuração do índice de preços do IBGE. Quem decide sobre o patamar da Selic não é Campos Neto, mas ele e um colegiado. Lula quer que a decisão sobre os juros seja política, o que será um desastre. Era melhor que pensasse que os juros somente aguardam o novo arcabouço fiscal, a reforma tributária e a segunda fase das medidas de equilíbrio das contas públicas para caírem naturalmente.  

É difícil entender o que o presidente pretende. Se quer fritar Campos Neto e tirá-lo do cargo, dessa forma hostil vai criar uma confusão nos mercados que pode levar, inclusive, a um ataque especulativo. O Banco Central independente é um assunto para o Congresso e não para o Palácio do Planalto. Aliás, BC independente ou autônomo é um eufemismo que, em última instância, quer dizer que o primeiro não é manipulável e o segundo, sim. O presidente tem tratado desses temas como se estivesse em um palanque de campanha, esbravejando e gesticulando furiosamente. Deveria falar dessa forma sobre a fome, a gestão hídrica no Nordeste e a tragédia humanitária nas aldeias Yanomami para as plateias respectivas. A postura de Lula é inexplicável. Pode fazer muito mal ao país. E amansar a memória dos desserviços que seu antecessor fez ao Brasil.

#Fernando Haddad #Lula #Mario Henrique Simonsen

Crônica do desamor entre gigantes – Parte I

15/12/2021
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As críticas do ministro Paulo Guedes ao professor Affonso Celso Pastore, porque ele serviu ao regime militar – foi presidente do BC no governo do general Figueiredo -, são desonestas. Guedes tinha em Pastore sua referência intelectual quando jovem. Trabalhou na Funcef à época em que a instituição era dirigida pelo seu atual desafeto.

De lá pulou para o IBMEC – sob a direção geral de Roberto Castello Branco e a presidência de João Paulo dos Reis Velloso. Muitos ouviram Guedes se rasgar em elogios a Pastore nas aulas e conversas com os professores da antiga instituição, quando ela se situava bem em frente ao Museu de Arte Moderna (MAM), lá pela década de 80. O atual ministro metia o malho em Mario Henrique Simonsen e afagava seu então dileto economista.

Depois virou casaca e passou a achar Simonsen “o maior de todos os tempos no Brasil”. O folclórico e falecido economista Augusto Bragança – uma espécie de “Roniquito” do setor (Quem conheceu Ronald Russel Wallace de Chevalier, irmão de Scarlet Moon e amigo de Simonsen vai entender a comparação) – implicou com os exagerados elogios. Um dia, Bragança, que também era pesquisador do IBMEC, cismou que daria “uma porrada” em Guedes se ouvisse ele repetir a cantilena de novo. A ameaça foi testemunhada por muitos pesquisadores da casa. E assustou uns e outros. Afinal, Bragança tinha um pé fora da casinha. Mas, ficou nisso. “Bragunça”, como era chamado, no fundo até gostava de Guedes. Achava ele engraçado. Pois é.

 

Um triângulo entre notáveis economistas – Parte II

O triângulo Affonso Celso Pastore, Mario Henrique Simonsen e Paulo Guedes, ainda que este último fosse à época apenas um coadjuvante, teve seus outros momentos de estranheza, no qual a dubiedade do atual ministro da Economia se fez presente. Em um deles, o general Golbery do Couto e Silva é quem pontifica. Guedes não gostava de Simonsen, que desdenhava de Guedes, que gostava de Pastore, que era do time de Delfim, que tinha pinimba com Simonsen.

Um episódio do qual o RR tem certeza foi o da participação do general Golbery em uma “fofocalhada”. Durante evento fechado para empresários, Guedes e Pastore meteram o malho em Simonsen, que era então ministro da Fazenda. Golbery, que adorava Simonsen, fez chegar a ele uma fita gravada pelo SNI, registrando as frases nada airosas de Pastore e Guedes. Pouco depois, Pastore e Simonsen teriam se encontrado no Aeroporto Santos Dumont, ambos indo para SP.

O primeiro estendeu a mão ao segundo, que não levantou a sua para cumprimentar o “melhor Chicago boy do Brasil” – título que disputava com outro presidente do  BC durante o regime militar, Carlos Geraldo Langoni. Pastore, que não era de levar desaforo para casa, baixou as mãos e deu de costas a Simonsen. E esfriaram relações durante um bom tempo. Porém, a animosidade não foi eterna. Pastore nunca entendeu o episódio, pois não sabia da fita do SNI. A partir daí aumentou o descaso de Simonsen por Guedes. É só uma historieta do desamor cruzado entre três grandes economistas.

#Affonso Celso Pastore #Ibmec #Mario Henrique Simonsen #Museu de Arte Moderna #Paulo Guedes #Roberto Castello Branco

Paulo Guedes busca inspiração em Simonsen para relançar refinanciamento compensatório

27/03/2019
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Os elogios recentes do ministro da Economia, Paulo Guedes, ao professor Mario Henrique Simonsen podem revelar a atualidade e a inspiração em uma das ideias do mestre. Corriam os anos 70, e a economia derretia com a inadimplência de pessoas físicas e jurídicas. Simonsen, que nunca rezou pela cartilha da ortodoxia econômica, bolou uma forma de estimular a liquidez sem emissão monetária ou endividamento. Batizou o engenhoso instrumento de refinanciamento compensatório.

A receita de Simonsen determinava que o Banco Central liberasse recursos do compulsório bancário para que as instituições financeiras pudessem renegociar dívidas de empresas e pessoas físicas, evitando, assim, uma quebradeira em massa. Guedes, que à época não comungava com a medida, está tentando utilizá-la para sacudir o consumo. O assunto está em estudos pela equipe econômica. Sem expectativas de novos investimentos e com as despesas do governo contidas, o papel de desfibrilador da economia, neste ano, ficou restrito a algum aquecimento do mercado interno.

E qualquer resíduo a mais no PIB conta ponto. Durante a campanha presidencial, Ciro Gomes plagiou Simonsen e defendeu o refinanciamento de todas as pessoas físicas penduradas no SPC. No modelo original estavam incluídas as pessoas jurídicas. Hoje dar essa guarida para as empresas seria cometer um haraquiri político. Atualmente, mais de 60 milhões de brasileiros estão inadimplentes, sendo que a maior parte são idosos. A medida atinge, portanto, grande parte do público que é impactado pelas mensagens sobre a reforma da Previdência.

O “refinanciamento compensatório” vai direto na veia da taxa de desemprego, que está quase imóvel na faixa de 12%; suaviza a impopularidade das mudanças na Previdência; reconhece que os bancos, mesmo abarrotados de dinheiro, não acreditam mais na clientela, que se encontra com o nome sujo. O dinheiro seria carimbado. Somente poderia ser usado para renegociar as dívidas daqueles que penam no SPC e estão excluídos do mercado de consumo. Uma garantia para que os bancos voltem a emprestar. Seria uma iniciativa com impacto direto no bolso dos brasileiros que mais se ressentem da marcha lenta da economia. O fato de Paulo Guedes estudar a adoção da medida revela não só a atualidade do pensamento do mestre, mas também a inspiração em uma das suas ideias, que poderá ser relançada em breve. É um sincero, ainda que tardio, elogio a Mario Henrique Simonsen.

#Mario Henrique Simonsen #Paulo Guedes

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