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Política

Sucessão em agência da OEA para o setor agrícola entra no radar de Trump

13/08/2025
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Um evento historicamente de menor relevância na agenda do multilateralismo nas Américas está ganhando peso na esteira do bombardeio tarifário de Donald Trump. Trata-se da sucessão na diretoria geral do Instituto de Cooperação para a Agricultura (IICA) – a eleição está marcada para o próximo mês de novembro.

O órgão é o braço técnico e diplomático da OEA (Organização dos Estados Americanos) para o setor agrícola, perpassando desde questões de ordem comercial a temas igualmente delicados, como estratégias nacionais para segurança alimentar e mudanças climáticas.

Segundo informações filtradas do Itamaraty, o Brasil deverá apoiar a candidatura do engenheiro agrônomo Muhammad Ibrahim, da Guiana. Ibrahim defende bandeiras como cooperação multilateral, transformação rural sustentável e ações de Estado compartilhadas para garantir o suprimento alimentar na região. São propostas que não vicejam na lavoura de Trump.

De acordo com uma fonte do Ministério das Relações Exteriores, os Estados Unidos, habitualmente alheios à eleição do IICA, têm dado sinais de que pretendem influenciar na sucessão do argentino Manuel Otero, que deixará o cargo no início de 2026 após dois mandatos.

Já surgem, inclusive, evidências públicas nessa direção, vide recentes declarações do híbrido de ruralista e diplomata Kip Tom, uma das principais vozes do setor agrícola nos Estados Unidos.

No mês passado, durante o II Encontro de Federações Agrícolas das Américas, em São José da Costa Rica, Tom disse textualmente que o IICA é “organismo mais bem preparado da região para defender os interesses do setor agropecuário”. Sobretudo se forem os interesses dos Estados Unidos…

Vale esmiuçar o personagem em questão. Kip Tom é representante da oitava geração de um dos mais tradicionais e poderosos clãs do agronegócio norte-americano. Desde os anos 1830, sua família domina a produção de sementes e de grãos no estado de Indiana.

No primeiro mandato de Donald Trump, Tom foi embaixador dos Estados Unidos na ONU, junto à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), ao Programa Alimentar Mundial (PAM) e ao Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA). É um notório defensor da política “American First” e de medidas protecionistas para os agricultores norte-americanos (“Os Estados Unidos devem proteger suas terras agrícolas de adversários estrangeiros, notadamente a China”).

O governo Trump tem uma política muito clara em relação a tratados e organismos multilaterais. Das duas uma: ou os controla ou os enfraquece. Neste segundo caso, foi assim que deixou o Acordo de Paris, a Unesco, a OMS, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, a Unesco e a Organização Mundial da Saúde.

O Instituto de Cooperação para a Agricultura tem poder decisório restrito e representatividade decrescente — como, aliás, a própria OEA, uma instituição cada vez mais enfraquecida, a exemplo das organizações internacionais de forma geral.

Ainda assim, trata-se de uma instância de discussão multilateral por onde passam temas sensíveis para os Estados Unidos. Entre os interesses do governo Trump no IICA estão moldar normas sanitárias, fitossanitárias e ambientais e regras de importação e exportação; desmontar discussões sobre eventuais barreiras a produtos agrícolas norte-americanos; e minar ou – por que não dizer? – sabotar qualquer iniciativa de composição multilateral nas Américas que seja um contraponto aos Estados Unidos.

Em última e principal instância, evitar que os BRICs, em especial a China, aumentem sua área de influência sobre o agronegócio na região. O Brasil, maior potência agroambiental das Américas, é uma peça que tem seu peso nesse tabuleiro. Principalmente agora que se tornou um dos maiores alvos da diplomacia da chantagem de Donald Trump.

Para o país, seria importante arregimentar outros apoios na região à eleição de Muhammad Ibrahim. Ainda não está claro se os Estados Unidos vão apresentar uma candidatura própria ou trabalhar um nome de oposição a Ibrahim.

O certo é que, caso consiga instrumentalizar o IICA para impor regras comerciais e padrões sanitários, fitossanitários e ambientais calibrados pela e para o seu agronegócio, na prática os norte-americanos estarão criando novos embaraços a produtos agrícolas brasileiros.

#Donad Trump #OEA

O que precisa ser dito

Quo vadis, Donaldus? II

15/04/2025
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O maior risco para a economia dos Estados Unidos reside hoje no crescimento acelerado da dívida pública. Em 1969, a dívida somava US$ 366 bilhões. Em 2000, alcançou US$ 5,6 trilhões. Durante a crise financeira de 2008, saltou para cerca de US$ 10 trilhões. Em 2020, atingiu US$ 27,7 trilhões e, em 2025, estima-se que ultrapasse US$ 35 trilhões, o equivalente a mais de 120% do PIB norte-americano. Esse aumento foi impulsionado por gastos com guerras (como as do Iraque e Afeganistão, além, mais recentemente, a da Ucrânia), programas sociais (Medicare, Social Security), estímulos econômicos (como na crise de 2008 e na pandemia de 2020) e reduções fiscais sem a contrapartida de corte de gastos (como no Brasil). Todos os presidentes, independentemente de sua coloração política, têm contribuído para tal crescimento.
A trajetória ascendente da dívida gera preocupações cada vez maiores com respeito à sua sustentabilidade, em especial porque os juros que incidem sobre ela consomem fração crescente do orçamento federal. Paralelamente, cresce também o risco eventual de um calote e de seus efeitos devastadores sobre a predominância histórica do dólar como moeda de reserva internacional.
Mas será que Trump desconhece problemas de tamanha magnitude? Evidentemente que, malgrado sua ignorância em matéria econômica, o homem de negócios que já pediu várias vezes recuperação judicial para suas empresas sabe que é impossível conviver com uma dívida que se avoluma qual bola de neve. No entanto, como é típico dele, recentemente questionou – sem provas – não apenas o tamanho da dívida federal, mas também os métodos usados para calculá-la, alegando que o DOGE de Elon Musk tinha descoberto fraudes potenciais. Além disso, declarou que o país “agora não é tão rico. Devemos US$ 36 trilhões… porque deixamos todas essas nações se aproveitarem de nós”. Mais uma vez uma distorção extraordinária da realidade e a escolha dos inimigos externos para justificar suas medidas radicais.
No entanto, por trás desse palavreado agressivo, Trump vem efetivamente buscando reduzir a dívida pública de três maneiras.
A primeira consiste em, tomando emprestado a motosserra de Javier Milei, permitir que Musk ataque o déficit orçamentário mediante a amputação de agências governamentais e programas de cunho social, embora já venha crescendo o mal-estar interno com os resultados de tais cortes. Mais significativo é o fato de que, tendo anunciado que eliminaria US$ 1 trilhão do orçamento, Musk há poucos dias admitiu que essa cifra ficaria mais próxima de US$ 150 bilhões, quantia decepcionante à luz da estimativa de US$ 2 trilhões de déficit no ano em curso.
A segunda está implícita em seu suposto papel de “pacificador”, uma vez que os esforços para encerrar os conflitos herdados da administração Biden têm como objetivo real reduzir os brutais gastos militares do país. Nessa linha de raciocínio, Trump tem inovado de forma assustadora para os aliados e clientes do país. Por exemplo, busca receber de uma Ucrânia devastada o pagamento pelas despesas com armamentos incorridas pelos Estados Unidos ao longo do conflito, caracterizando-as como um empréstimo! A outra forma, já sugerida no caso da Coreia do Sul, implica cobrar tais despesas dos países defendidos pelas forças militares dos Estados Unidos, na essência transformando-as em tropas de mercenários quando antes eram o último bastião dos valores ocidentais.
E a terceira é aquela que ganha as manchetes com o vai e vem na área de comércio internacional analisado no artigo anterior. Nesse caso, podemos aqui evitar o debate técnico sobre o eventual vínculo entre déficit orçamentário e déficit comercial, o qual existe, mas depende também de vários outros fatores. O importante é reconhecer que as medidas atabalhoadas de Trump – ao impor tarifas que aumentariam em tese as receitas governamentais e reduziriam os gastos com importações, favorecendo assim a redução da dívida pública –, tiveram um efeito tétrico nas bolsas de valores de todo o mundo e eliminaram de vez a confiança no atual ocupante da Casa Branca.
O que é menos sabido, e mais grave, é que essas incertezas começam a abalar a confiança nos bônus do Tesouro norte-americano e, indiretamente, no dólar. Os chamados “treasuries”, sempre vistos como portos seguros, como os papéis mais livres de risco em todo o planeta, mostram sinais de fraqueza sobretudo diante das indicações de que seus maiores detentores, Japão e China, vêm se desfazendo de parcelas significativas dos títulos mantidos como reserva estratégica. Na medida em que, no corrente ano, o Tesouro deve emitir entre US$ 10 trilhões e US$ 15 trilhões desses títulos para financiar os déficits previstos, a demanda global por eles será crucial a fim de determinar para onde vai o imperador Donaldus. Toda a atenção é pouca!

Jorio Dauster é colaborador especial do Relatório Reservado

#Donad Trump #Estados Unidos #Jorio Dauster

O que precisa ser dito

Eleitores de Trump merecem uma boa dose de schadenfreude?

7/04/2025
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Jorio Dauster, colaborador especial

Embora eu infelizmente não fale alemão, há uma palavra naquele idioma que sempre me encantou por expressar um sentimento humano que não encontra equivalente em nenhuma outra língua e ao qual talvez só sejam imunes os santos: schadenfreude. Literalmente, a alegria malévola sentida diante do infortúnio sofrido por outrem. Impossível desconhecer que tal sentimento transparece no noticiário sobre as perdas gigantescas sofridas pelas chamadas big techs devido ao derretimento das bolsas norte-americanas provocado pelo tarifaço de Trump.

Esse júbilo maldoso do qual – cumpre confessar – muitos de nós participamos se dirige em particular àqueles bilionários que acorreram sorridentes à posse de Donald Trump no Capitólio, tais como Elon Musk, Mark Zuckerberg e Jeff Bezos, que já viram evaporar algumas dezenas de bilhões de seus patrimônios.  Mas, segundo o Índice de Bilionários da Bloomberg, o estrago tem grande amplitude: as perdas no mercado já excedem US$ 200 bilhões para os 500 indivíduos mais ricos do mundo.

No entanto, todos parecem esquecer que os mercados de ações norte-americanos são também um refúgio para investidores de todo o planeta e, em especial, o abrigo antes considerado inexpugnável para a poupança da classe média do país. É difícil encontrar dados sólidos sobre os valores envolvidos, mas basta assinalar que, no ano passado, mais da metade das famílias norte-americanas tinham seus recursos aplicados em fundos mútuos, no valor de US$ 71 bilhões. Não é difícil imaginar quão dolorosas serão para os cidadãos atingidos as perdas já ocorridas e aquelas que ainda podem vir por aí caso sejam mantidas as tarifas em vigor – como Trump acaba de confirmar. Se a isso se somar uma aceleração da inflação e uma recessão econômica, o padrão de vida presente e futuro de boa parte da população do país estará seriamente ameaçado.

E, então, vem a pergunta que não pode ser calada: quantos dos vitimados votaram em Trump sem acreditar que ele faria tudo que proclamava durante a campanha? Esses também merecerão uma boa dose de schadenfreude?

#Donad Trump #Economia #Estados Unidos

O que precisa ser dito

A primeira salva de tiros

21/02/2025
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Jorio Dauster, colaborador especial

Não por coincidência, algumas horas depois que Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas foram denunciadas pela Procuradoria Geral da República por organização criminosa com o objetivo de levar o país a uma ruptura democrática, o grupo Trump Media & Technology Group (TMTG), do qual o presidente norte-americano é sócio majoritário, entrou com um processo contra Alexandre Moraes num tribunal federal da cidade de Tampa. A empresa juntou-se ao Rumble, uma plataforma de vídeo baseada na Flórida, a fim de impedir as tentativas do juiz da Suprema Corte brasileira de alegadamente forçar tal plataforma a censurar contas pertencentes a um usuário brasileiro baseado nos Estados Unidos. Deixo aos juristas a incumbência de analisar tal processo que, segundo um excelente advogado de Washington, meu amigo, seria inválida à luz da doutrina estabelecida e, de todo modo, não exerceria efeitos no Brasil.

O que nos interessa é entender por que o próprio New York Times teria definido a ação como “incomum” e “extraordinária”. E o motivo é óbvio: trata-se do primeiro gesto concreto de Donald Trump, usando um instrumento que lhe pertence pessoalmente, contra a figura brasileira que simboliza toda a reação nacional contra as comprovadas tentativas do ex-chefe de Estado de subverter o resultado das urnas nas eleições de 2022. Nesse sentido, sem dúvida significa que frutificaram os apelos de Bolsonaro e seus seguidores, em particular do filho Eduardo, no sentido de mobilizar o atual ocupante da Casa Branca em seu favor, esforço que anteriormente estava concentrado sobretudo nas mãos de Elon Musk e Steve Bannon.

De certo só temos que se trata da primeira salva de tiros, mas certamente outras virão no curso do julgamento que em breve terá início no Supremo Tribunal Federal. E o importante é que o governo se prepare para lidar com esses gestos de caráter pessoal ao mesmo tempo em que deverá ser chamado a responder a incursões a nível de Estado, como, por exemplo, a imposição de tarifas a produtos exportados pelo Brasil. No entanto, em ambos os casos é altamente recomendável que o presidente Lula deixe de comentar as ações de Trump em falas informais, só reagindo, com o necessário e sopesado vigor, diante de decisões concretas que nos afetem materialmente. Para tal, poderia mirar-se no exemplo de Claudia Sheinbaum, que reage com dignidade, mas também com sobriedade a ameaças reais à soberania do México, em especial depois que Trump, em 20 de janeiro, designou os cartéis de traficantes de drogas como organizações terroristas. Ao longo do delicado processo que se anuncia, Lula deve contar com a experiência do Itamaraty, que sem dúvida está amplamente qualificado a servir de porta-voz quando necessário e contribuir na redação dos textos que guiariam as manifestações presidenciais.

#Donad Trump #Jair Bolsonaro #PGR

Política

Tarcísio de Freitas oscila entre o boné de Trump e os extremos climáticos

24/01/2025
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Tarcísio de Freitas é um pêndulo, com movimentos milimetricamente calculados. O governador de São Paulo recusou convite de Eduardo Bolsonaro para integrar a comitiva bolsonarista puro-sangue que foi a Washington acompanhar a posse de Donald Trump. Evitou, assim, figurar no time dos “barrados no baile” – nem Eduardo nem Michelle Bolsonaro tiveram acesso aos eventos oficiais.

Mas se, por um lado, manteve prudente distância física do clã, por outro o pendular Freitas teve o cuidado de não se dissociar de todo de Bolsonaro ao postar o vídeo nas redes sociais em que aparece usando um boné com o slogan trumpista “Make America Great Again”. Passadas 48 horas, já sem o adereço, o governador moveu-se delicadamente na direção dos moderados ao anunciar a criação de um conselho de mudanças climáticas em São Paulo. 

#Donad Trump #Tarcísio de Freitas

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