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O que precisa ser dito
Ouro na B3: um passo pequeno para o mercado, um ajuste profundo na lógica de portfólio
24/07/2025Enquanto a maioria persegue a próxima grande alta da Bolsa, um movimento silencioso traz o que realmente importa para o investidor sofisticado: descorrelação, proteção e equilíbrio intertemporal.
A estreia dos contratos futuros de ouro na B3 pode parecer, à primeira vista, apenas mais uma adição ao cardápio de derivativos. Mas por trás dessa inclusão técnica está um convite sutil — e necessário — a repensarmos o conceito de diversificação de portfólio no Brasil.
Por aqui, ainda se confunde “diversificação” com pulverização entre ativos nacionais. Troca-se ações por fundos imobiliários, pré-fixados por pós, mas tudo segue atrelado a um mesmo denominador comum: a maré da economia brasileira. O que falta, de fato, é descorrelação real.
Foi Harry Markowitz, o pai da Teoria Moderna do Portfólio, quem nos ensinou que o risco relevante não é o risco isolado dos ativos, mas o risco do portfólio como um todo, e que este pode ser reduzido pela combinação de ativos com comportamentos distintos em diferentes cenários. Não é sobre “o que sobe mais”, mas sobre o que se comporta de forma independente.
Nesse sentido, o ouro cumpre um papel fundamental — e historicamente comprovado — como ativo de baixa correlação com ações, renda fixa tradicional e moedas fiduciárias. Em momentos de estresse sistêmico, ele tende a preservar valor. Em ciclos inflacionários, pode funcionar como defesa. E em ambientes de juros negativos reais, como reserva de valor intergeracional. Mais do que uma proteção de crise, ele pode funcionar como um contraponto estrutural à volatilidade e aos ciclos econômicos dominados por política monetária. Não é uma aposta; é uma precaução inteligente.
Não se trata de fetichizar o metal. Trata-se de compreender sua função como componente racional de portfólios resilientes. Países com mercado de capitais maduros entendem isso há décadas. O Brasil está apenas começando a dispor dos instrumentos necessários para internalizar essa lógica.
O investidor local já contava com o ETF GOLD11, negociado na B3 desde 2020, que oferece uma forma prática de se expor ao ouro. O GOLD11 replica, de maneira passiva, a variação do preço do metal no mercado internacional — principalmente via contratos futuros listados nos EUA. Trata-se de uma alternativa simples, líquida e acessível para investidores de varejo.
O contrato GLD, por outro lado, introduz um grau de complexidade e sofisticação. Como todo derivativo, ele envolve ajuste diário de posições, alavancagem, margem de garantia e vencimentos mensais. Ele não é para todos, mas é valioso para quem precisa de hedge dinâmico, gestão ativa de risco ou estratégias táticas de curto prazo.
GOLD11 ou GLD: qual é o seu ouro?
A escolha entre GOLD11 e GLD depende menos do preço do ouro e mais do perfil e da intenção do investidor. Eis o resumo:
| Característica | Contrato Futuro (GLD) | ETF GOLD11 |
| Tipo | Derivativo | Fundo de índice (ETF) |
| Perfil do investidor | Profissional / Trader | Varejo / Estratégico |
| Objetivo | Hedge / Especulação | Exposição passiva / Diversificação |
| Tributação | 15% sobre lucro | 15% sobre lucro |
| Liquidez | Moderada (depende do vencimento) | Alta (negociação em Bolsa) |
| Risco | Alto (alavancado) | Moderado (não alavancado) |
| Custódia física de ouro | Não | Não |
O que precisa ser dito?
O contrato futuro de ouro na B3 não é, por si só, revolucionário. Mas é uma peça relevante no quebra-cabeça da maturação do mercado local. Quando bem utilizado, o ouro não é um ativo de emergência — é um ativo de inteligência. E sua real utilidade aparece não quando tudo está desmoronando, mas quando o investidor está pensando em anos, e não em meses.
Marcos Tanner é um colaborador especial do Relatório Reservado
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B3 assume o papel de xerife do mercado que um dia já foi da CVM
6/05/2024A B3 é hoje a principal demolidora da casa de alvenaria em que se tornou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Retificamos: é o segundo maior agente desconstrutor; o primeiro é a própria CVM, que canibaliza a si mesma. A B3 comprou a velha tese da autorregulamentação do mercado e está fazendo uma verdadeira maratona nessa área. Antes, ninguém acreditava nas regras que provinham das bolsas, “antro de prostituição”, segundo o saudoso economista Moyses Glatt, um dos criadores dos mercados a termo na Bolsa de Valores de São Paulo. Essa percepção mudou. A B3, junção de todas as antigas bolsas, não para de criar regulamentos de aperfeiçoamento do Novo Mercado. Hoje, a instituição é quem organiza de fato a “legiferação” e implementa as ações de melhoria das transações com ações e debêntures. Agora mesmo, modernizou a anacrônica concepção de que a CVM é o xerife do mercado. A B3, entre várias mudanças de aprimoramento das obrigações das companhias abertas, vai criar uma espécie de fast track para suspender as empresas que estejam se valendo de práticas suspeitas, fora das regras de conformidade ou com conduta desapropriada. Talvez a CVM seja informada em tempo real. Talvez depois do fato consumado. Ou, sabe-se lá, no dia seguinte por meio do mercado. Mas as missões estatutárias de acompanhamento, denúncia e punição, algumas das principais atribuições da CVM, vão para a prateleira do passado. O xerife agora é outro.
Só para dar um background sobre a CVM, a autarquia é uma espécie de patinho feio entre as instituições que gravitam em torno do mercado acionário. Seu orçamento é irrisório. Suas multas são baixas. Grande parte delas prescreve através das contestações na Justiça. O número de processos julgados pela instituição caiu para mais da metade entre 2018 e 2022. A CVM iniciou o ano de 2023 com um déficit de 30% no quadro de servidores em relação a 2010. Segundo estudo da FGV, em 2022 só houve 50 julgamentos. O comportamento de privilegiar a pena pecuniária permaneceu como parâmetro. Só que o valor total dessas multas, em 2022, segundo o estudo obtido pelo RR, somou R$ 48,4 milhões, sendo que R$ 20,4 milhões correspondem a ilícitos em mercado. Em não raros casos ainda cabe recurso. A título de blague, talvez fosse o caso de a CVM pensar no instituto da delação premiada. Puniria mais e arrecadaria muito mais.
Nos últimos três governos, foi acalentada a junção da CVM e da Superintendência de Seguros Privados (Susep), outro patinho feio xifópago. O novo órgão ficaria mais parrudo, teria um status maior e poderia pleitear melhores condições de funcionamento ao governo federal. Mas, bulhufas! Nada aconteceu e nada deverá acontecer. Alguém, imagina, por exemplo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, realizando uma visita ou mesmo um elogio à CVM, órgão vinculado a sua Pasta? Apostas na mesa. O que ficou é a saudade dos tempos em que a autarquia era presidida por Roberto Texeira da Costa, um quadro de estirpe, no período de implementação da Lei das S/A, com um notável colegiado e tendo em Mario Henrique Simonsen um dos maiores estimuladores. Mas isso é conversa de ancião. Por ora, é tecer loas à B3, que segue na sua cruzada pelo aperfeiçoamento do mercado de valores mobiliários. Que a instituição, hoje “mãe de todas as bolsas brasileiras”, continue entregando o bom serviço que presta.
Justiça
In memorian
21/08/2018E lá se foram as últimas imagens dos tempos de apogeu da Bolsa de Valores do Rio. Na semana passada, a pinacoteca que ainda estava guardada no prédio da antiga Bolsa, na Praça XV, teria sido transferida para a B3, em São Paulo. No acervo, Di Cavalcanti, Pancetti e Debret. Até a galeria de retratos dos presidentes da Bolsa do Rio tomou o rumo de São Paulo. Embora não vá ter muita serventia por lá..