Salmonella é o “S” da sigla ESG na JBS

  • 4/06/2021
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Há um risco duplo para a JBS caso se confirmem as ameaças da Arábia Saudita de suspender todas as importações de carne de frango brasileira por tempo indeterminado – informação que circula nos bastidores do setor. O primeiro é a perda direta da receita com as exportações para o país asiático, o que, na prática, nem chega a ser algo tão significativo: estima-se que as vendas para a Arábia Saudita representem apenas 1% do faturamento total do grupo – R$ 270 bilhões no ano passado. O segundo risco, o que dói mesmo para a JBS, é o impacto intangível da medida. O eventual embargo dos árabes ao frango brasileiro representará um duro baque para a marca e a reputação institucional da empresa. Todo este enredo atinge aquele que é o maior calcanhar de Aquiles da JBS – noves fora os delitos dos irmãos Batista: suas práticas socioambientais.

No início de maio, a Arábia Saudita interrompeu as compras de carne de frango de 11 frigoríficos brasileiros, sendo sete deles da companhia – ou seja, um terço das unidades de abate habilitadas para vender ao país asiático (21 no total). O governo árabe demorou ao menos três dias para revelar o que motivou a suspensão dos embarques, período em que a JBS rezou para que a razão da medida não fosse a contaminação do produto por salmonella. De nada adiantaram as preces da empresa: a Arábia Saudita alegou ter detectado a presença da bactéria em vários lotes de frango importados do Brasil.

Como se sabe, a JBS está gastando mundos e fundos para incorporar a sigla EGS (Environmental, Socialand Governance) ao seu brand. Recentemente, a empresa anunciou um investimento de US$ 1 bilhão até 2030 para reduzir as emissões de carbono. Por ora, no entanto, o “S” de ESG parece remeter ao microscópico agente de contaminação da imagem da companhia: a salmonella está grudada no histórico recente da JBS. Em julho de 2019, o Reino Unido devolveu 1,4 mil toneladas de carne de frango importadas do Brasil após identificar a presença da bactéria. Parte havia sido produzida pela empresa.

Em dezembro de 2018, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão análogo à Anvisa nos Estados Unidos, cerca de 330 pessoas foram infectadas por salmonella detectada em lotes de carne bovina produzidas pela JBS Tolleson, subsidiária do grupo. 91 consumidores foram hospitalizados. Um mês antes, a JBS chegou a recolher três mil toneladas de carne moída nos Estados Unidos por suspeita de contaminação pelo microrganismo. Voltando um pouco mais no tempo, em 2012, o serviço de fiscalização veterinária e fitossanitária da Rússia (Rosselkhoznadzor) também encontrou a presença da salmonella em carne bovina congelada da JBS. Como se sabe, a reprodução da bactéria está vinculada à qualidade do ambiente de produção como um todo. A própria ONU adota o conceito de Saúde Única, que considera a integração entre saúde humana, animal e ambiental.

Se a suspensão dos 11 frigoríficos e a ameaça de um embargo total da Arábia Saudita são ruins para a JBS, são piores ainda para o Brasil. O imbróglio deve desaguar em uma guerra na OMC. Segundo maior importador de carne de frango brasileira, atrás apenas da China, a Arábia já acionou a entidade. O país quer reduzir o prazo de validade de frangos in natura congelados e de seus cortes, de um ano para três meses contados a partir da data de abate. O Brasil, por sua vez, já anunciou que também entrará contra o país asiático na OMC, mais precisamente junto ao Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias da Organização. O governo contesta as acusações contra os frigoríficos brasileiros. Está no seu papel. Na avaliação das autoridades, a Arábia Saudita encontrou um pretexto para diminuir as importações, uma vez que o país tem planos de se tornar autossuficiente na produção de carne de frango. Não consta que o mesmo argumento possa ser aplicado aos Estados Unidos, Reino Unido e Rússia, quando, cada um a seu tempo, trituram a reputação da JBS.

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