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Economia
A finalização do pacote fiscal, que será anunciado a qualquer momento, esbarrou, em várias situações, não somente nas travas do presidente Lula, mas na intervenção do ministro chefe da Casa Civil, Rui Costa. Não fosse a paciência de Jó do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o anúncio do corte de gastos teria ficado para algum ponto futuro no primeiro trimestre de 2025. Costa aludia a problemas de ordem política a cada proposta que era apresentada. Sensível a esses temas, principalmente na agenda social, Lula pediu tempo para pensar sempre que uma nova proposta chegava a sua mesa. Pensava e vetava. Vinha uma medida substitutiva, e o processo se repetia. Uma das questões levantadas por Costa passou pelo posicionamento de Lula em relação ao futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. Se o plano de corte nas despesas for tíbio, os juros subirão, contaminando os demais indicadores macroeconômicos. O mercado já precificou que as medidas de ajuste fiscal serão rasas, por isso a projeção da Selic para 2024 e 2025 cresce a cada Boletim Focus. Para as instituições financeiras, a taxa básica fechará 2024 em 11,75%; e chegará ao fim de 2025 em 12,25%. No próximo ano, confirmando-se a projeção de uma inflação de 4,34%, o Brasil experimentará um juro real próximo a 8%.
Trata-se de uma taxa que redimiria o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, dos seus “crimes” na política monetária. Campos Neto sempre disse que a taxa de juros do Brasil era absurdamente alta, devido a variáveis crônicas, ou seja, expansão fiscal descontrolada, dívida pública elevada, taxa de poupança menor e crédito direcionado. Esses fatores influenciariam o juro neutro. Pois bem, o presidente do BC foi tratado como um pária por Lula. O seu sucessor, Gabriel Galípolo, vai receber o mesmo balaio de gatos. Com uma diferença para pior: a expectativa em relação ao corte de gastos. Se o ajuste fiscal for raquítico, a economia pode desandar. Dito isso, é dólar forte e juros altos, aqui e lá fora, como prevê o guru do mercado, Luis Stuhlberger, criador do mítico Fundo Verde, em entrevista ao Estado de S. Paulo, na edição de ontem.
Na reunião “definitiva” para que Lula batesse o martelo em relação às medidas de ajuste, Gabriel Galípolo foi chamado a participar, não só como deferência, mas para afinar sua opinião sobre as decisões futuras do BC na área monetária. O convite a Galípolo foi mais uma intervenção de Rui Costa. O ministro da Casa Civil já alertou o presidente sobre o risco político de alusões negativas a um eventual tratamento assimétrico em relação aos presidentes do BC. Afinal, o que Lula fará e dirá quando os juros reais forem à estratosfera já na gestão de Galípolo no BC? Segundo o RR apurou, na reunião, o presidente não chegou a tirar o assunto de letra, mas no final mandou tocar para frente. Afinal, “Galípolo é um dos nossos”, e Campos Neto sempre “foi deles”. Lula veste mal o figurino da coerência. Talvez tente se safar dos juros monstruosos mencionando o PIB, que poderá crescer 3,17% em 2024, segundo o Boletim Focus desta semana. Há instituições que já dão como certo um PIB de 3,5% no acumulado do ano. Mas também, segundo o mesmo Focus, o índice desabará para 1,95% em 2025 e permanecerá praticamente no mesmo patamar em 2026 – a estimativa de um crescimento de 2% é igual há 68 semanas. Males dos juros altos, que são antibióticos para a inflação e um purgante para o crescimento econômico. De qualquer forma, há um dilema moral a ser resolvido. E Rui Costa gosta de costurar esse tricô, que acaba, na maioria das vezes, sendo impeditivo das propostas de Fernando Haddad.
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