Buscar
Destaque
O lobby do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) para se livrar do Imposto Seletivo (IS) é legítimo, mas enganoso. O Ibram colocou todas as suas escavadeiras no Congresso e na mídia. Por ora, sem sucesso. Já perdeu a primeira batalha, ontem, na Câmara. E será muito difícil virar o jogo no Senado. A entidade diz que, com o IS, o setor terá menos competitividade nas vendas externas. Alega ainda que a indústria da extração mineral não é poluente. Nenhuma das duas afirmações é verdadeira. Em primeiro lugar, as vantagens comparativas do Brasil no mercado internacional se devem muito mais à qualidade do seu minério e à existência de um comprador quase cativo, a China. Além disso, a mineração polui um bocado. Entre os “menores” males causados ao meio ambiente, estão alteração da paisagem, desmatamento e devastação do solo.
Na votação de ontem na Câmara, as mineradoras conseguiram, ao menos, reduzir o teto da alíquota para 0,25% – na proposta original, esse índice chegava a 1%. Ainda assim, saíram derrotadas no “mérito”, que era escapar do imposto. Da parte do ministro Fernando Haddad, não qualquer simpatia pelo lobby da entidade. Antes de tudo, é preciso qualificar o Ibram, que deveria se chamar “Ibref”, algo como o Instituto Brasileiro do Ferro. A Vale é a principal mantenedora da entidade, que, na prática, acaba servindo como uma espécie de biombo para os interesses da empresa. No governo, as manifestações da entidade contra o imposto são lidas, sobretudo, como um protesto da companhia. A exclusão do IS na mineração aumentaria a alíquota integral, prejudicando setores realmente relevantes para a população. É tudo o que Haddad não quer. O Brasil é o maior produtor de minério de ferro do mundo. Suas reservas alcançam cerca de 29 bilhões de toneladas.
Não é a primeira vez que o Ibram faz sua choradeira contra um gravame, reclamando que a tributação vai extinguir o setor. Foi assim com a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), criada para amenizar os problemas criados pela extração dos minérios. A CFEM foi regulamentada e nada do desastre previsto pelo Ibram ocorreu. A Vale, para quem não se lembra – os moradores de Minas Gerais não se esquecem jamais – abriu uma verdadeira cratera nas cercanias de Belo Horizonte. Segundo estudo do Ministério do Meio Ambiente, nas áreas de exploração do ferro, a vegetação é removida para dar lugar à lavra a céu aberto, iniciando também outro impacto ambiental, a exposição dos solos, os quais perdem a sua fertilidade e ficam sujeitos a processos erosivos.
O Ministério do Meio Ambiente também aponta problemas nas áreas de mineração de ferro, como a presença de antigas barragens de contenção, que podem se romper e provocar sérios danos ao local em que se encontram. Não é preciso lembrar das tragedias de Mariana e Brumadinho para ilustrar a advertência da Pasta. Há também o perigo do desmatamento. Parte dos remanescentes da Mata Atlântica pertence às mineradoras. A atividade de mineração contribui para a chamada chuva ácida e o efeito estufa.
Os principais poluentes da extração mineral são óxidos de nitrogênio, de carbono, os hidrocarbonetos e os materiais particulados em dispersão. O último grupo está presente em todas as atividades de mineração. Elas prejudicam a qualidade do ar, favorecendo doenças como a asma, pneumonia e câncer de pulmão. Um estudo feito no Quadrilátero Ferrífero mostra que florestas urbanas na área reduziram em 206,7 o número anual de internações de crianças (de zero a 14 anos) com problemas respiratórios. Ou seja: pode-se afirmar que a extração de todas as substâncias minerais é poluente em algum nível.
Mas a mineração gera riqueza, aliás, muita riqueza. Esse motivo parece ser desconsiderado pelo Ibram, quando praticamente decreta a morte do setor caso não seja isento do IS pelo governo. Aliás, a mineração é um dos principais alvos das multinacionais e fundos de uma maneira em geral dispostos a investir no Brasil. Agora, com a corrida por metais com uso na renovação da matriz energética, como lítio, níquel, cobalto, vanádio e inclusive o grafeno, que tinha o ex-presidente Jair Bolsonaro como seu principal propagandista, será possível afirmar que eles são desinformados em relação ao IS. E os nativos, o que pensam disso na intimidade das suas empresas? Pois bem, segundo Sondagem do setor Mineral da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa Mineral (ABPM), 77% das companhias pretendem investir para aumentar a capacidade produtiva nos próximos 12 meses.
O IS foi criado para reduzir o consumo de bens que fazem mal à saúde, e poluição é um desses males, além de reduzir a alíquota integral que recai sobre todos os demais produtos. Não há nada de injusto, nem de economicamente inapropriado na medida. Espernear é um direito de todos. Mas cabe ao Ibram buscar um pouco mais de fundo de verdade na sua causa. Até para o feitiço não se virar contra o feiticeiro.
Todos os direitos reservados 1966-2024.