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Como encaixar o mercado e os eleitores no pacote fiscal? Eis o dilema de Haddad

  • 10/12/2024
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Fernando Haddad é hoje um “ministro-marisco”, espremido entre o rochedo e o mar. No caso, entre o mercado e a população, entes com interesses díspares aos quais o seu pacote fiscal precisa atender. Tarefa difícil, uma vez que contentar um é praticamente sinônimo de descontentar o outro. Na tentativa de escapar desse trade off, Haddad tem discutido com sua equipe uma solução intermediária capaz de agradar – ou desagradar menos – aos dois lados.

Segundo informações apuradas pelo RR, uma das propostas levadas ao presidente Lula é a redução da faixa de isenção do Imposto de Renda, de R$ 5 mil para algo próximo de R$ 3,5 mil. Trata-se de um movimento de risco, a começar pelo timing. É preciso “desanunciar” o que já foi anunciado e ainda negociar com o Congresso. Há também o potencial desgaste político de tirar da boca da classe média o pedaço de um doce já oferecido.

No entanto, o ajuste na regra do IR seria embalado dentro de um discurso de cunho social. Ou seja, de que a recalibragem é necessária para o governo não ser forçado a cortar benefícios para compensar a perda de arrecadação. Seria uma cota de sacrifício em favor de classes mais baixas. Ao mesmo tempo, a recomposição da receita tributária do IR permitiria diminuir a alíquota do imposto sobre fortunas.

Ou seja: seria uma forma de evitar perdas radicais de um lado e do outro. Ao mesmo tempo, funcionaria como um hedge para o próprio governo. Uma das preocupações da equipe econômica com o ajuste fiscal é reduzir ao máximo a necessidade de contingenciamento antecipado do orçamento.

Mercado, classe média, desvalidos, Centrão, PT, arcabouço fiscal… Não é simples encaixar tantas variáveis na mesma equação. A mesa sempre ficará manca de um lado. O desafio da equipe econômica é reduzir o tamanho do calço. Nos últimos dias, após a repercussão negativa das medidas anunciadas em cadeia de rádio e TV por Fernando Haddad, já se falou na necessidade de um pacote 2.

Parte da pressão nesse sentido vem do próprio PT. As novas ações em estudo pela equipe econômica, em especial o ajuste na dosimetria da isenção do IR, são tratadas na Fazenda e no Planejamento como uma maneira de evitar uma grande desfiguração das medidas já divulgadas. Nem a primeira versão, nem uma segunda com mudanças bruscas. Seria, digamos assim, um pacote versão 1.5.

“É a economia, estúpido”! Mas é também “a política, imbecil!”. Este é um fator fundamental no cálculo do governo. Os principais pilares do corte de despesas – que, na verdade, está muito mais para um remanejamento de recursos e uma gambiarra no teto de gastos – terão de passar pelo Congresso. O que aumenta a necessidade de a Fazenda reduzir o maniqueísmo das medidas – mais pró-mercado ou mais pró-população.

Caso contrário, é como se o governo estivesse dando à Câmara e ao Senado a capacidade de decidir para que lado o pacote fiscal vai pender e, com isso, sob certo aspecto antecipar o pleito de 2026. As propostas aprovadas pelo Congresso funcionariam como um indicador antecedente da eleição presidencial. Tudo o que Lula, o eterno Plano A do PT para 2026, e Haddad, o Plano B do próprio Lula, menos precisam neste momento é dar mais poder ao Centrão. Enquanto isso, imprensado entre o rochedo e o mar, o ministro da Fazenda quebra a cabeça para evitar que o pacote fiscal vire limo.

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