Um réquiem para o “empresário-estadista”

  • 22/02/2017
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O diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp, Paulo Francini, não é apenas um dos dirigentes da entidade. Francini foi um dos artífices do “Manifesto dos Oito”, juntamente com Antônio Ermírio de Moraes, Claudio Bardella, José Mindlin, Jorge Gerdau, Paulo Vellinho, Paulo Villares, Laerte Setubal Filho e Severo Gomes. Eram idos de 1978, quando os empresários enfrentaram a linha dura do governo Ernesto Geisel escrevendo um dos capítulos mais notáveis – e são tão poucos – da defesa da produção, da indústria e do emprego.

Hoje, Francini não esconde o desencanto com a abulia de seus pares, que abandonaram o front da luta política e se retiraram do debate público. Em conversa com o RR, Paulo Francini, diz que o empresário foi esvaziado e se esvaziou, paripassu ao derretimento da indústria nacional. “Não temos mais a representatividade do passado. A capacidade de associações e federações de interferir na condução do país desapareceu. Isso quer dizer que nós falhamos? Lógico que nós falhamos.” Com elogiável franqueza e boa dose de autocrítica, Francini não poupa sequer a própria casa ao condenar a paralisia de seus congêneres, notadamente a partir dos anos 90, quando o modelo de substituição das importações já se mostrava esgotado.

“A Fiesp e o IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) não foram capazes de apresentar um discurso alternativo ao pensamento neoliberal, então dominante. As entidades patronais não demonstraram ser capazes de uma articulação semelhante à apresentada pela classe trabalhadora. Há quase 10 anos, realizamos na Fiesp um seminário sobre desindustrialização, e sabe qual foi o resultado? Críticas e acusações de que o modelo de crescimento defendido pela entidade estava ultrapassado. O discurso era de que só os países subdesenvolvidos continuavam a depender da indústria para atingir o crescimento.”

O empresário é o lobo do empresário. Na opinião de Francini, com a sua omissão, a classe está abrindo mão de um patrimônio conquistado “a duras penas” durante mais de 50 anos. Se, na década de 80, a participação da indústria no PIB passava de 21%, hoje esse índice derrapa entre 10% e 11%. “É uma vergonha! Esse declínio começa com Fernando Collor, que já assume demonstrando seu rancor em relação à indústria, e ganha velocidade com Fernando Henrique Cardoso. Ninguém vai me dizer que o ministro Pedro Malan e o presidente do Banco Central, Gustavo Franco, defendiam a indústria.

A equipe econômica do Fernando Henrique era formada basicamente por economistas do Rio de Janeiro pró-mercado, praticava uma política voltada para os interesses do setor financeiro e das empresas estrangeiras no Brasil. A partir de então, os industriais que, associados a segmentos da alta burocracia, haviam dado suporte à estratégia da industrialização por substituição das importações, foram atropelados por uma nova coalizão dominante, formada pelo setor financeiro e as empresas e interesses multinacionais”. O BNDES, claro, tem lugar cativo em qualquer diatribe abalizada sobre a desindustrialização do país. Paulo Francini enfatiza que a tese de uma instituição mais voltada ao mercado do que à indústria já vem se desenhando há muito tempo.

“A nova política de financiamento na qual o banco transfere o seu papel de fomento para o setor privado é hoje uma realidade. A participação do BNDES no processo de industrialização do país foi fundamental, mas o banco abandonou esse papel já há alguns anos.” Francini vocaliza o desalento de uma espécie que parece fadada à extinção. “O nosso sonho de desenvolvimento do país falhou. Quando falávamos de um processo de desindustrialização, todos, incluindo o governo, nos consideravam alarmistas. Hoje ninguém tem mais dúvida disso. Só não reconhece isso quem é míope. Ou estúpido”.

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