O decálogo de “cacarecos” de Henrique Meirelles
O embrulho de medidas contra a recessão em fase de finalização na Fazenda é constituído pelo que Henrique Meirelles chama de “cacarecos”. Até a marketada de lançá-lo como um decálogo para o resgate do crescimento econômico remonta à época dos pacotes, quando os governos em desespero despejavam, emergencialmente, um toró de medidas salvacionistas. As ações pré-natalinas pretendidas, à exceção de uma ou duas, são uma colcha remendada com retalhos do passado e sugestões de terceiros.
Para quem assumiu a Pasta da Fazenda como um esteio para a credibilidade tíbia de Michel Temer, as derrotas dos últimos dois meses são mesmo de aumentar a calvície. Mas é o que se tem. E Meireles é um pragmático. O decálogo de medidas milagrosas em linhas gerais seria o seguinte:
- Redução do compulsório sobre os depósitos bancários para refinanciamento da dívida de empresas e pessoas físicas. Sugestão de Roberto Setubal, que vai contra a contenção da liquidez planejada por Henrique Meirelles como núcleo do ajuste.
- Queda mais acentuada da Selic. Sugestão de Deus e o mundo. Pressupõe uma série de reduções de 0,5% na Selic a partir do próximo Copom.
- Recuo progressivo das altas na TJLP. Uma taxa mais baixa estimularia os empresários a buscarem o dinheiro empoçado no banco. Sugestão de Paulo Skaf.
- Desonerações tributárias seletivas. O objetivo seria atrelar as bondades aos novos investimentos e aumento de empregos. A medida seria financiada com a extinção das “más desonerações” e parte dos impostos e multas da segunda parte da repatriação. Sugestão do IEDI e do pessoal da indústria.
- Utilização dos recursos do FGTS no financiamento de obras de infraestrutura. Sugestão de Guido Mantega, ontem, hoje e sempre.
- Emissão de títulos públicos para garantia cambial dos investimentos. Não se sabe ainda quem emitiria esses títulos, se o BNDES, Banco do Brasil etc. Sugestão da Câmara de Comércio Americana e de 10 entre 10 investidores estrangeiros.
- Novas facilidades para o crédito consignado. O governo quer aumentar o crédito popular. O FGTS, via Caixa Econômica Federal, seria usado como hedge do trabalhador. Há quem diga que a medida pode levar o trabalhador a trocar poupança por consignado.
- Lei de Recuperação Judicial dos Estados. Algo na linha, devo, não nego, pago quando puder, o que faria o dinheiro fluir nas unidades federativas. Tem de ser feita, não é um retalho. Sugestão de Pezão, em primeiro, e dos demais governadores, em segundo.
- Securitização da dívida ativa. Trata-se de uma iniciativa para ontem, pois seus recursos podem financiar algumas das outras medidas já citadas. Sugestão de Joaquim Levy, na sua gestão na Fazenda.
- Rodada de investimentos sociais (habitação popular, energia para todos, bolsa família etc.). Algum recurso seria pescado do orçamento deste ano (como se sabe, Henrique Meirelles inflou a projeção de déficit primário para ter alguma sobra para os restos a pagar e os “cacarecos”). A medida seria anunciada com pompa e um reforço do compliance, ou seja, na gestão anterior era dado e desviado, agora é dado, fiscalizado e usufruído. Sugestão de Geddel Vieira Lima.
Obs: As medidas microeconômicas em gestação no governo – ajustes regulatórios, extinção da obrigatoriedade da compra de equipamentos de fabricação doméstica, desapropriação de imóveis, revisão de incentivos fiscais etc – são corretas e podem mexer positivamente nas expectativas, ainda que não tenham maior impacto antirrecessivo no curto prazo. O risco é o governo incorrer na quebra de contratos. Se depender de opiniões como a do economista Marcos Lisboa, o governo deve ir com tudo porque não há recursos. Mas devagar com o andor. Não há receita de ajuste fiscal nem monetário que rearrume uma economia ferida pela quebra de contratos juridicamente perfeitos.
#Henrique Meirelles